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Críticas

Notas sobre Um Escândalo

Unidas (e fragilizadas) pelo desejo

Por Luiz Joaquim | 10.04.2007 (terça-feira)

Há uma precisão perturbadora na interpretação de Judi
Dench como Barbara, uma rígida professora ginasial em
Londres que alimenta uma misto de fascinação pela sua
colega mais nova, e novata, Sheba (Cate Blanchett). Na
realidade, Barbara desenvolve um desejo obsessivo por
Sheba que, por sua vez, vê despertar um desejo por um
de seus alunos, de 15 anos de idade. Desejo é,
portanto, o que une as duas mulheres.

Mais do que a solidão esmagadora com a qual vive
Barbara – “espero o fim de semana com ansiedade pelo
prazer de ir à lavanderia”, revela ela em seu diário
secreto -, mais do que a perturbação existencial de
Sheba – casada com seu ex-professor bem mais velho
(Bill Nighy), e com dois filhos, sendo o mais novo
portador da Síndrome de Down -, é o desejo que conduz
as duas mulheres à situações limítofres. Uma como
manipulada, outra como manipuladora.

Quem dirige aqui é Richard Eyre e o roteiro é de
Patrick Marber (de “Closer”). Mas a adaptação de
“Notas Sobre um Escândalo”, feita a partir do romance
“What Was She Thinking? Notes On a Scandal”, da
escritora britânica Zöe Heller, talvez reduza um pouco
a personalidade de suas duas protagonistas aos seus
básicos instintos em função da ação no filme. Mesmo
assim, tanto Barbara quanto Sheba ganham graça e
consistência pela primazia de suas duas intérpretes,
que concorreram ao Oscar, junto a Philip Glass (trilha
sonora) e Marber, somando quatro indicações em 2007.

Parece haver um interesse maior no roteiro de Marber
pela mente de Barbara. Tanto que é pela narração em
off da velha professora que vamos conhecendo os outros
personagens que vão desenhar a trama. Aqui as
observação de Barbara, registradas em seu diário, são
impiedosos. Para a ela, a descontração após um jantar
com a família de Sheba é uma “maneira peculiar da
burguesia viver”.

Suas observações sobre o garoto com Down seriam
impublicáveis, e sobre ela mesma, sobre a secura de
sua vida, cita o Evangelho: “Judas teve a dignidade de
se enforcar, mas apenas pela pela perspectiva de
Mateus, o mais sentimental dos apóstolos”.

O que temos no filme é, enfim, o confronto de duas das
melhores atrizes uma caçando sua presa e outra
tentando se defender ao mesmo tempo em que luta contra
seus desejos. Enquanto Dench dá uma perspectiva
assustadora, Blanchett apresenta-se como uma fonte de
interesse masculino e feminino para aproximação. Pena
que a seqüência final de “Notas…” insista em mostra
Barbara mais monstruosa do que ela poderia ser;
insinuando que ali exista um animal predador, como um
seria killer – coisa que não é. Ela é apenas um pessoa
deformada pela solidão, e isso basta para perturbar.

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