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Um ídolo se vai, seus súditos o saudam

Reginaldo Rossi, 1943, 2013

Por Luiz Joaquim | 23.12.2013 (segunda-feira)

Foi um domingo diferente. O dia de ontem (22/12) amanheceu sob uma ressaca distinta das habituais, quando geralmente o excesso da bebida ingerida na noite de sábado deixa sua marca apenas pelo mau-estar físico. O gosto amargo deste domingo era coletivo, ainda pautado pela ausência de Reginaldo Rossi. O Rei do Brega, que faleceu na manhã de sexta-feira aos 70 anos vítima de falência múltipla dos órgãos após tratamento lutando contra o cancer, tinha sua presença ainda viva nos redutos boêmios do Recife, cidade que o artista tanto celebrou.

O nome “Reginaldo” – tratado assim mesmo, sem nenhuma cerimônia pelos seus súditos, como se fosse um amigo próximo – estava não só na boca do povo, mas também nas caixas de som dos bares e nos CDs e DVDs que os vendedores ambulantes ofereciam no bairro da Madalena. “Eu tinha o [DVD do show] -Cabaret do Rossi-, mas ele sumiu”, lamentava o empresário Alexandre Nobre, 52 anos, enquanto buscava o mesmo produto no acervo do ambulante.

Alexandre, que estava reunido com amigos na “Confraria dos Chifrudos”, no Mercado da Madalena, lembra que um dos shows mais marcantes que viu ao vivo do Rei foi no Restaurante Varanda. “Ele chegou muito atrasado, mas o show foi tão bom que valeu a espera”, recorda. Já o comerciante Fernando Correia, proprietário da “Confraria”, contou que a notícia da morte do músico chegou a ele antes que a mídia a anunciasse formalmente.

“A esposa de um dos médicos que tratava Reginaldo estava aqui no mercado na manhã de sexta, e ela recebeu uma ligação do marido logo após o óbito. A gente não quis acreditar, mas depois a mídia confirmou”, lembrou o comerciante. Desde então, o assunto neste bar – onde o próprio cantor, em 2009, comemorou seu aniversário de 66 anos – não foi outro senão sobre a simplicidade e alegria daquele ídolo do povo. “Todos bebiam em homenagem ao Rei, mas tinha um clima de tristeza no ar”, destacou Fernando.

Já no Mercado da Boa Vista, também na manhã de ontem, um grupo de amigas preferia lembrar da Majestade do Brega pela sua alegria. Antes mesmo de a rádio “A Voz do Mercado” – um circuito interno de auto-falantes no espaço – começar a tocar às 10h30 a música “Desterro” para todos ouvirem, Flávia de Andrade, Suzy Emery, Iris Rodrigues e Juliana Paixão já tinham curtido “A raposa e as uvas”, “Leviana” e “As quatro estações” pelo celular de Flávia. “Tenho um acervo aqui [no celular] com 15 canções dele”, contava orgulhosa.

Fã incondicional, a dona do celular, só em 2013, conferiu duas apresentações ao vivo do cantor. E explicou sua admiração: “Seu brega não era como os de hoje, que só falam de sacanagem. A letra falava era de amor”. Já Suzy fez questão de destacar que foi o Rei que levou o nome do Recife para o Brasil por um sentimento autêntico; enquanto Juliana gostava de sua irreverência e do tema das músicas, sobre o dia-a-dia do povo. “E eu”, frisou Iris, “assim que soube de sua morte, procurei o primeiro bar para tomar uma [cerveja] em homenagem ao Rei”.

Enquanto isso, no bairro do Pina, outra fã de Reginaldo se preparara para encarar o trabalho a partir das 14h no “Bar dos Cornos”. Era a garçonete Cilene Ferreira, 50 anos. “Já levei muita gáia, não vou negar. Também já rói muito osso ouvindo Reginaldo”, revelou. E para a pergunta sobre qual sua música preferida, a resposta não podia ser outra: “Garçom”.

Túmulo do artista recebe fãs
Ao contrário do final da tarde de sábado, quando uma histórica multidão acompanhou o sepultamento de Reginaldo Rossi no cemitério Morada da Paz, em Paulista, o mesmo local estava tranquilo na manhã de ontem. Mesmo assim o Rei não estava sozinho. O taxista Walter Campos, 39 anos, fez questão de passar por lá, já às 9h30 da manhã, para dar seu adeus ao ídolo.

“Ontem eu fiquei apenas olhando o cortejo da casa do meu irmão, que fica do outro lado da estrada [PE15]. Era muito gente e achei melhor vir agora, na calma”, disse Walter enquanto procurava o melhor ângulo com a câmera de seu celular para, pela primeira vez na vida, fotografar um túmulo. “Vou guardar como uma recordação”, explicou.

Ainda velando o sepulcro coberto de flores, estavam dois coveiros. Um deles, Marcos Martins, que trabalhara um dia antes enterrando o Rei. “O que aconteceu ontem [sábado] aqui foi muito bonito. Nunca vi coisa igual. Era muita gente emocionada cantando as músicas dele”, disse.

Responsável pelo enterro de outras celebridades no mesmo cemitério, como Dominguinhos – falecido em julho -, Marcos disse que até o momento a comoção pela morte do Rei do Brega superou a de todas que ele já viu em sua profissão. “Acho que nunca vou esquecer este dia”, concluiu.

“Ela era tão popular e querido que a gente tem mais é que celebrar sua memória. Para mim, acima de tudo, Reginaldo foi um homem feliz. E isto é o que mais importa”
Iris Rodrigues

“Passei a sexta-feira revivendo o passado ao som de Reginaldo no [clube] Batutas de São José, e hoje [domingo] ele certamente será homenageado no Clube Carnavalesco [Mixto] Lenhadores, para onde eu vou celebrar sua memória”
Antônio Campos, policial reformado

“Era uma figura única no nosso meio. Sua morte traz um perda irreparável. Lembro dos papos que tive com ele, era um sujeito simples. Agora é rezar para aparecer um outro Rei, que é algo difícil”
Fernando Correia, comerciante

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