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Festivais

40º Festival de Brasília (2007, noites 2 e 3)

José Eduardo Belmonte exibe seu 2º longa-metragem

Por Luiz Joaquim | 23.11.2007 (sexta-feira)

BRASÍLIA (DF) – A exibição de “Meu Mundo em Perigo” (foto acima), de José Eduardo Belmonte, começou muito aguardada pelo público e confirmou as expectativas de aplausos após a sessão. Único cineasta local a participar da mostra competitiva, se tornou um dos destaques do cinema brasileiro e é dono de uma obra que merece atenção. Dessa vez, Belmonte se descolou de Brasília, tão presente até “A Concepção”, seu projeto anterior, e fincou os pés de seu novo filme em São Paulo. É lá onde moram Elias (Eucir de Souza) e seu filho Ariel, que têm sua ligação cortada abruptamente com o reaparecimento da mãe da criança, uma ex-compulsiva que reivinidica a guarda do filho. Ao mesmo tempo em que sofre pela desestruturação de sua família, acaba marcando também a vida de Fito (Milhem Cortaz), com conseqüências trágicas para ambos. A culpa por uma morte acidental guia as ações de Elias, que se envolve com Ísis (Rosane Mulholland), uma garota que finge não falar para fugir do passado, assim como ele.

Embora seja o melhor filme do diretor, o filme cai na mesma armadilha de “A Concepção”: a construção tão esmerada do silêncio entre Ísis e Elias, cai por terra com a necessidade de se verbalizar sentimentos. Com essa opção, o filme perde fôlego e se torna arrastado, fora de foco narrativo, contrastando com a primeira metade do filme, extremamente bem-construída em suas relações familiares. A relação entre a fuga de Elias e a busca de Fito pelo algoz de seu pai se torna artificial, esquemática, quase esquecida principalmente após o aparecimento de Ísis. O contraponto entre a sisudez das situações e a música de matriz africana traz um choque interessante pro filme, ainda que esse seja um recurso usado de forma excessiva.

curtas
Os filmes pernambucanos voltam a dividir opiniões no Festival de Brasília. Após a exibição, na quarta-feira, 21, do longa-metragem pernambucano “Amigos de Risco”, de Daniel Bandeira, o Estado teve como representante, na quinta-feira, 22, o curta-metragem “Décimo Segundo”, de Leonardo Lacca. Enquanto “ADR” recebeu aplausos mornos do público e dividiu a crítica, a produção da Trincheira Filmes foi fortemente vaiada em suas duas sessões. A história de um casal de jovens que se reencontram e se relacionam por meio de silêncios e descompassos não recebeu eco dos espectadores, historicamente conhecidos por manifestarem abertamente suas preferências, para o bem o para o mal. “Não esperava ser tão vaiado. Ficamos muito surpresos com essa polêmica, mas isso é até bom, pois isso enriquece o debate entre quem defende o filme e quem tem opinião contrária”, avaliou Lacca.

Os atores Rita Carelli e Irandhir Santos (o Joca de “Amigos de Risco” e o Quaderna da minissérie “A Pedra do Reino”) defendem o casal que se revê, em clima tenso e melancólico, mas sem discussões ou sobressaltos, optando acertadamente por um caminho íntimo, em tom menor. Não sabemos nada sobre suas personalidades, o lugar onde estão, e apenas se deduz, nas entrelinhas, o tipo de relação que tiveram no passado. É sobre a mulher que se apóia a narrativa, restando ao personagem masculino preencher o vácuo que ela deixa com suas ações. A presença de uma terceira pessoa nessa relação, ainda que nunca seja física, é palpável. Esteticamente bem cuidado, chegando ao limite do maneirismo, no entanto, carece de “timing”, deixando no ar uma sensação de prolongamento excessivo e final frouxo. A referência ao realizador David Lynch, que influenciou grandemente a formação cinematográfica de Lacca, se perde no meio dessa relação intimista. Não é exatamente um filme de fácil assimilação, mas, apesar dos furos, não merecia ser vaiado.

No debate que se seguiu à apresentação do filme, Leonardo Lacca defendeu a relação de impossibilidades entre os dois personagens. Ao responder à provocação de um crítico, que disse “não ter entendido nada”, o diretor alegou que o filme falava por si. “Minha idéia de cinema é mais sensorial, sem privilegiar a interpretação racional. Acredito na beleza da sutileza”.

Bem recebido pelo público, o primeiro curta-metragem de ontem (quinta-feira, 22), “Café com Leite”, é um exercício correto e simpático de um jovem cineasta paulista, Daniel Ribeiro, que retrata com sensibilidade e sem bandeiras panfletárias a vida de Danilo, um homossexual que vê seus planos de morar com o namorado, Marcos, caírem por terra com a morte dos pais. Alçado de repente a uma condição de autoridade, se vê obrigado a renunciar ao que seria uma vida em comum pela pressão de ter uma criança sob sua responsabilidade. Esse terceiro elemento, à primeira vista tratado como um intruso pela criança, se integra cada vez mais a essa nova família de duas pessoas de forma contraditória. Quanto menos é rejeitado, mais percebe que seu convívio é impossível, e a ruptura definitiva se torna inevitável.

Ao contrário de “Décimo Segundo”, que aposta em uma narrativa mais aberta às intervenções do espectador, o círculo se fecha na idéia comum aos outros dois filmes da noite: a desconstrução da intimidade pela impossibilidade ou incompatibilidade. Uma das qualidades do filme é a superação de um defeito recorrente na dramaturgia nacional, a atuação da criança. Esperto, mas sem parecer adulto, o personagem Lucas percebe tudo o que acontece à sua volta e traz naturalismo à narrativa.

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