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Críticas

Onde os Fracos não Têm Vez

Sem lugar para o passado

Por Luiz Joaquim | 14.02.2008 (quinta-feira)

É excitante ver dois autores cinematográficos atuando novamente e de maneira tão inspirada dentro da coerência pela qual conduziram suas carreiras. Com “Onde os Fracos Não Têm Vez” (No Country for Old Men”, EUA, 2007), os irmãos Joe e Ethan Coen voltam ao lugar inóspito – as planícies secas e áridas de um deserto texano, próximo a fronteira com o México – que serviu de cenário também para “Gosto de Sangue” (1984), primeiro longa da dupla, pela qual o mundo já podia entender o talento dos dois.

Em seus filmes, os Coen contam excelentes histórias sobre “gato caçando rato”, e “Onde os Fracos…” – concorrendo a oito Oscars – tem, de certo modo, seu estofo estrutural semelhante ao de um “Tom & Jerry”. O detalhe, e são eles que fazem a grande diferença, é que os Coen mostram a hostilidade do tempo moderno (os anos são os 1970 e/ou 1980) contra aqueles que não conseguem acompanhá-lo para lembrar. Joe e Ethan lembram os espectador que se “o tempo melhora o homem”, como diz o xerife Bell (Tommy Lee Jones), o mesmo tempo parece só piorar a terra, ou o mundo em que vivemos.

O título original (sem lugar para os velhos, numa tradução livre) casa melhor com essa idéia, que está refletida no lacônico xerife Bell de Lee Jones. Ele está prestes a se aposentar, mas não consegue evitar seu susto ao conhecer as novas formas de violência que descobre ao ler o jornal, ou no próprio ofício. Tudo se transformou, inclusive os rituais de maldade, e Bell não se encaixa nesse novo tempo. Valores, regras, morais vão se metamorfoseando e é sobre isso que “Onde os Fracos…” (adaptado do livro homônimo de vencedor do Pulitzer, Cormac McCarthy) fala muito bem.

Bell está situado entre o “Tom” e o “Jerry” da história. O rato é Moss (Josh Brolin, que pode ser visto nos em cartaz “O Gângster” e “No Vale das Sombras”, este último também com Lee Jones). Moss é um modesto caçador texano que encontra quatro carros rodeados por defuntos, ainda empunhando metralhados quentes. Há também muitas drogas e, depois, uma mala com dois milhões de dólares. Uma das vítimas da chacina, quase-vivo, pede água em castelhano. Moss não atende, mas à noite o remorso o leva a cena do crime. É esse seu erro, de onde começa a caçada.

O “gato” é o perturbado Anton Chigurh (Javier Barden, oscarizável), uma lendário facínora impiedoso, mas cool, que transita como um fantasma pelo Texas. Ele quer resgatar o que Moss robou e não poupa a vida ninguém que encontra pela frente, a não ser que um moeda o impeça. Bardem, com um cabelinho desenhado que pode suscitar tanto humor e temor, dosa com precisão essas duas extremidades em seu personagem. A lógica de seu mundo particular e às regras que determina para seguir adiante, parecem justas com o mundo que Bell gostaria de manter. Para Anton, a palavra de um homem deve ser obedecida.

Mas, mais uma vez, os Coen revertem a lógica dos homens (ou apenas a de Anton) com um acidente, como se dissessem que este mundo é cruel e nossa civilização é uma aberração onde as coisas pelas quais mais tememos estão apenas esperando um sinal vermelho para ultrapassar e nos atingir em cheio.

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