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Críticas

Sangue Negro

O divórcio da moral com o capitalismo

Por Luiz Joaquim | 15.02.2008 (sexta-feira)

Entrando em cartaz, “Sangue Negro” (There Will Be Blood”, EUA, 2007), de Paul Thomas Anderson, mostra porque é o maior concorrente de “Onde os Fracos não Têm Vez” para o Oscar 2008. Ambos brigam por oito estatuetas na cerimônia de premiação que acontece domingo (24). Após curta e impressionante carreira com três longas-metragens P.T. Anderson, 37 anos, parece nos dar seu filme mais maduro não só nos termos de harmonia entre imagem, som e montagem, mas também nos aspectos da alma, ou nos mistérios que ela carrega.

Há, aqui, na história de Daniel Plainview (Daniel Day-Lewis, o mais forte oscarizável do ano) um rebuliço de situações provocantes que desenham a figura de um homem contra si mesmo. Na verdade, este personagem adaptado por Anderson a partir do romance “Oil!”, de Upton Sinclair, é um mistério em seus propósitos. Plainview é um empreendedor do petróleo no início do século 20 e, nesse sentido, seu arcabouço de empresário, que veio do nada, e expande sua fome pelo sucesso não é nada para se espantar. Mas espanta sim, a ferocidade deste homem, que não dá margem para enxergarmos alguma sombra de humanidade nele.

O que parece ser seu único elo com o humano, está na relação com o filho pequeno, H. W. (Dillon Fraiser), que de certa maneira não deixa de ser um bom cartão de visitas para Plainview quando vai negociar novas terras, ricas em petróleo, mas ignoradas pelos proprietários. Entre os vários atritos que promove para construir seu império petrolífero, às custas de uma dose cavalar de tino capitalista em suas ações, Plainview encontra um forte obstáculo. Ela vem na figura de um pregador (o ótimo Paul Dano) que se diz iluminado por Deus, mas com um senso empreendedor tão afinado quanto o do investidor capitalista.

Uma das belezas de “Sangue Negro” é nos dar esse personagem, talvez um dos mais impenetráveis dos últimos anos, que, embora possamos falar dele por horas, nunca saberíamos defini-lo com precisão. Anderson não nós dá pista sobre o que movimenta Plainview, a não ser a ganância. Não há traço de piedade, remorso ou pena nele. A chegada de seu meio-irmão no meio da história também não ajuda a desvendar este monstro alimentado pelo poder e pela riqueza. Duas de suas frases traduzem bem seu objetivo mas não os explica: “Quero enriquecer para me isolar” e “Não preciso conhecer as pessoas para saber o que há de ruim nelas”.

A orquestração de Anderson para esse épico é completa com espetacular trilha-sonora de Jonny Greenwood, e com a direção de arte (Oscar à vista) de David Crank. Temos também Day-Lewis, assombrosamente, encarna a maldade de Plainview com uma força hipnótica. O ator não deixa brechas para dúvidas de que estamos diante do demônio encarnado no mais pródigo filho do capitalismo. Não há espaço para mulheres nem família, apenas petróleo, sucesso, dinheiro, e humilhação das grossa com seus competidores. O poder é um veneno, que só vai fazer Plainview parar quando matar Deus. O que consegue, metaforicamente, claro.

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