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Livro: Olhar Crítico

As bodas de ouro de Azeredo com o cinema

Por Luiz Joaquim | 09.03.2010 (terça-feira)

Para aqueles que ainda questionam o valor histórico de uma crítica cultural ou, mais especificamente, de uma crítica cinematográfica publicada nos jornais, está na hora de dar uma olhada no livro “Olhar Crítico: 50 Anos de Cinema Brasileiro” (416 págs., R$ 54), de Ely Azeredo, lançado semana passada pelo Instituto Moreira Salles. Para quem não sabe, se houvesse um panteão para a crítica cinematográfica brasileira, o nome do carioca Ely Azeredo estaria lá. É talvez o mais longevo operário desse ofício no Brasil, tendo atuado entre 1953 e 2003 na imprensa diária, escrevendo cerca de 4.350 resenhas, ensaios e críticas, de um total de 5.500 textos sobre cinema. A maior parte dessa escrita foi escoada nos jornais Tribuna da Imprensa, Jornal do Brasil e O Globo.

No livro, Azeredo selecionou 98 textos que apontam e refletem sobre obras essenciais realizadas nas cinco décadas em questão. O conteúdo faz da brochura um excelente resgate da memória do cinema brasileiro, uma vez que os textos estão originalmente transcritos da mesma época em que foram publicados por ocasião da estreia dos filmes. Temos então análises lúcidas e, às vezes, entusiasmadas tanto para os recentes “Cidade de Deus”, “Ônibus 174″, Carandiru” e “O Homem que Copiava”, quanto para os já clássicos “Macunaíma”, “Todas as Mulheres do Mundo”, “Pixote”, “Terra em Transe”, “Vidas Secas” e “Floradas na serra”.

Azeredo também apresenta outros títulos menos consagrados pela história de nosso cinema (e, por isso mesmo, ausentes das locadoras e das grades de programação na TV, mas não menos talentosos e essenciais) como “Um Homem Sem Importância” (1971), de Alberto Salvá, ou “A Intrusa” (1980), de Carlo Hugo Christensen, entre outros. No prefácio escrito por Alberto Dines, ex-colega do crítico no Jornal do Brasil nos anos 1960, o jornalista diz que “Ely Azeredo acompanhou com paixão o desabrochar do cinema brasileiro. A ele se atribuiu, com toda justiça, a paternidade da designação Cinema Novo, e esta paixão fica patente ao longo dessa antologia”.

Como o próprio Azeredo fala na introdução, sua longevidade não busca o “Guinness Book of Record”, mas a reflexão. E é por ter percorrido e observado de perto o fim da chanchada, a desvario da Vera Cruz, o Cinema Novo (denominação batizada por ele num texto para a Tribuna da Imprensa, e logo adotado por Glauber Rocha), a pornochanchada, os anos 1980 e 1990 e a Retomada que os textos mais recentes do autor são avaliações mais que balizada pela história vivida por ele.

Bom exemplo é sua defesa sobre “Cidade de Deus”, quando o crítico remete a si mesmo, quando avaliou “Rio 40 Graus” (1955), em seu lançamento. Ele diz: “obras de ruptura embaralham a cartilha. Faço críticas há 50 anos. Não soube avaliar, na emoção da estreia, a importância enorme de ‘Rio 40 Graus’, de Nelson Pereira dos Santos, historicamente incontestável…”. Na introdução, ele resgata o nome de Nelson Pereira também para uma de seus comentários, quando diz: “coube à crítica o papel de manter viva a discussão sobre a importância da criação de filmes em todos os momentos de crise ou recesso na produção nacional”

A antologia traz também um texto traçando a trajetória de Ely Azeredo como crítico, mas também como importante difusor do cinema no Brasil; as fichas técnico-artísticas de todos os filmes analisados; as referências bibliográficas utilizadas; e um índice completo dos filmes citados. Há ainda as notas de roda-pé – esclarecedoras como a que faz sobre o roteirista Leopoldo Serran (1948-2008) na crítica de “Tudo Bem” (1978), de Arnaldo Jabor. Como se não bastasse, o texto de Azeredo é dotado de uma elegância que não se vê mais publicada nos jornais de hoje. Indispensável.

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