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Festivais

39º Gramado (2011) – noite 4

Paulo Caldas:

Por Luiz Joaquim | 09.08.2011 (terça-feira)

GRAMADO (RS) – A quarta noite competitiva no 39º Festival de Cinema de Gramado, na segunda-feira, reservava uma expectativa não só para os pernambucanos, mas para a imprensa especializada nacional, uma vez que o terceiro longa-metragem de ficção de Paulo Caldas, “O País do Desejo”, era projetado no Palácio dos Festivais, inaugurando sua primeira exibição pública no Brasil – o filme já havia sido mostrado, 18 de junho, na Sicília (Itália), no Taormina Film Festival.

O interesse nacional encontra sentido no fato de que o nome de Caldas estar fortemente vinculado à fundação do cinema pernambucano como o conhecemos hoje por, há 26 anos, ter lançado o curta-metragem em 16mm “Nem Tudo São Flores”, como lembrou sua montadora Vânia Debs, aqui na entrevista coletiva em Gramado. Em 1997 Caldas (ao lado de Lírio Ferreira) faria “O Baile Perfumado”, colocando o Estado novamente na rota nacional do cinema; e em 2007, lança “Deserto Feliz” colocando-se num contexto contemporâneo, pela indignação social.

Em “O País do Desejo”, o realizador volta à polêmica social quando cria o Padre José (Fábio Assunção), filho de família abastada, e atuante na pobre paróquia de Santo Agostinho, próximo à fictícia localidade de Passárgada (locações em Olinda). Na primeira parte do filme, o Pe. José bate de frente com a decisão do arcebispo lusitano (vivido pelo ótimo ator português Nicolau Breyner) em excomungar a mãe e o médico que realiza o aborto em uma menina de 12 anos, estuprada pelo tio.

A situação é uma referência direta ao caso real de 2009, quando o arcebispo de Recife e Olinda, Dom José Cardoso Sobrinho, agiu da mesma forma diante de um aborto legal operado em uma menina de 9 anos. Em entrevista ontem pela manhã, Caldas comentou que, no filme, inicialmente a problemática que desencadearia a crise do Pe. José com a Igreja seria outra, mas a própria realidade lhe deu um mote mais forte.

Num segundo momento, “O País…” concentra sua dramaturgia na paixão do padre pela pianista Roberta (Maria Padilha), que precisa com urgência de um transplante de rins. Dessa forma, Caldas joga na tela três problemáticas distintas (dogma religioso, transplante de órgãos, e matrimônio no sacerdócio) mas, em Gramado, há quase um consenso que os 87 minutos do filme não conseguem resolver a dimensão de todas estas problemáticas.

De fato, percebe-se na produção, uma elaboração no roteiro de Caldas (com Amin Stepple e Pedro Severien), criando um universo coerente entre a realidade do padre – com sua família formada pelo pai (Germano Hauit), o médico irmão (Gabriel Braga Nunes) e a mãe moribunda -; com a realidade da pianista, desiludida com a arte e a vida.

Parece, entretanto, que o problema está nas sinapses que finalmente ligam as linhas dos dois. O momento, talvez, mais crítico aconteça entre o instante em que o padre é dispensado da paróquia pelo arcebispo, até sua declaração de amor à pianista. É um intervalo mínimo, e são pequenas as pistas que apontam o nascimento e/ou existência de uma paixão avassaladora ali. Fábio Assunção defendeu, em entrevista, que uma das orientações de Caldas na direção era que este filme era sobre “o amor antes dele acontecer”.

Outro ponto levantado foi a distância estética do novo filme para os anteriores do diretor. Paulo foi taxativo na resposta: “Este é o filme mais ‘Paulo Caldas’ que já fiz”. Para o realizador, não há sentido em se repetir e é preciso quebrar a idéia de ‘cinema pernambucano’ como um bloco estético unificado. E, citando Marcelo Gomes, reforçou: “Às vezes nos sentimos como se fossemos uma tapioca”.

Ainda do ponto de vista da provocação, atenção para a cena envolvendo hóstias sagradas e ketchup, protagonizada pela atriz curitibana, de descendência oriental, Juliana Kametani. Ela interpreta a enfermeira da mãe do padre José. Um grande momento no filme.

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