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Críticas

A Árvore da Vida

Uma estrela chamada ser-humano

Por Luiz Joaquim | 12.08.2011 (sexta-feira)

Assim como aconteceu há três meses, no 64º Festival de Cannes, chama a atenção hoje a possibilidade de termos acesso  nas salas de cinema da cidade, numa mesma semana, a dois filmes tão antagônicos no discurso mas, ao mesmo tempo, tão sedutores plasticamente e igualmente potentes em sua capacidade de envolvimento. É curioso também que, tanto Melancolia, de Lars Von Trier (no Cinema da Fundação) quando A árvore da vida (Tree of Life, EUA, 2011) de Terrence Malick (estreando nos multiplex) recorrem a astros celestiais para falar do maior dom que conhecemos: a vida.

Enquanto o dinamarquês põe em questão o rumo da existência frente ao que há de hostil na vida, o filme norte-americano – agraciado com a Palma de Ouro – celebra a existência a partir de dois aspectos: a “Graça” e a “Natureza”. Se por um lado, pela “Graça”, a existência age em função da harmonia entre os seres através de um autêntico altruísmo, sem interesse em sua auto-satisfação, despreocupada com injúrias e insultos; por outro lado, pela “Natureza”, a existência corre um caminho conflituoso.

É um caminho cujo desejo é só satisfazer a si mesmo, e que também usa os outros para atingir este fim. É também um caminho onde ele procura razões para se tornar infeliz, mesmo quando o mundo inteiro, ao seu redor, apresenta-se exuberante em seu esplendor.

Como forma de contextualizar estas ideia, Malick (também roteirista), 67 anos, usa uma estrutura aparentemente simples do ponto de vista dramático, mas extremamente sofisticada do ponto de visto cinematográfico, implicando numa cinestesia (sugestão de sensações pelo visual) hipnótica.

Pela dramaturgia, a estrutura nos oferece dois momentos. Um é com a família O’Brien (Brad Pitt, como o pai, Jessica Chastain, como a mãe, mais três filhos pre-adolescentes) vivendo nos anos 1950. O outro, é com Jack (Sean Penn), um destes filhos, crescido e confuso, nos dias de hoje.

No passado, a linha que rege a trama foca a obsessão do pai pela formação dos filhos. O personagem de Pitt encarna belamente esta confusão de carinho e fúria que é o ser-humano, representando o caminho da “Natureza”. Já a mãe olha genuinamente para além de si. Sendo ela própria a encarnação da “Graça”.

No meio desse turbilhão, entre a disciplina e o amor incondicional – no qual entra também a relação entre os irmãos -, cresce o pequeno Jack (Hunter McCracker), um filho que carrega para a vida inteira estas marcas, como constatamos no personagem de Penn nos dias de hoje.

É, inclusive pela voz da mãe que escutamos, com narração em off, o norte do filme sobre os caminhos da “Graça” e da “Natureza”. “Você precisa escolher um para seguir”, diz ela. Em paralelo, Malick nos oferece belas imagens etéreas sobre a evolução da vida na Terra, desde o Big Bang e o nascimento do universo, até onde estamos hoje. O que remete, imediatamente, ao clássico de Stanley Kubrick, 2001: Uma odisséia no espaço.

Mas, diferente de Kubrick, Malick alterna as duas narrativas sempre com a sua câmera contemplativa, livre do julgamento. Seguindo apenas como alguém que olha curioso para seus personagens e a relação deles com a natureza ao redor. Postura presente em outros filmes seus não menos belos como Além da linha vermelha (1998) e Novo mundo (2005), para citar os mais conhecidos.

Nesse aspecto, não deixa de impressionar que A árvore da vida exista hoje, considerando sua origem vinculada a Hollywood e o fogo do mercado do entretenimento e do hedonismo onde está lançado. Sua beleza e coragem só reforçam a força do autor que está por atrás de tudo isso. Autor bravo o suficiente para abrir a obra citando Jó, na Bíblia: “Onde estavas quando criei as fundações da Terra, quando as estrelas da manhã brilharam juntas, e todos os filhos de Deus gritavam de alegria?”. Sim, onde estávamos?

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