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Festivais

20o Cine-PE – noites 1 e 2 – longas

Sobre os primeiros longas do festival

Por Luiz Joaquim | 04.05.2016 (quarta-feira)

Dois dias de Cine-PE: Festival do Audiovisual, em sua 20ª edição (terceira no Cine São Luiz) e já há muito o que dizer. A primeira observação diz respeito ao publico na noite de abertura (segunda-feira, 02/05). A fila de espectadores circundando o palácio na rua da Aurora enchia os olhos e; a plateia no auditório do cinema desenhou um cenário bonito.

Cenário, entretanto, diferente do que se vê no festival Janela Internacional de Cinema (também no São Luiz). Apesar de lotar o espaço como costuma fazer o festival da CinemasCopio Produções, a plateia do Cine-PE busca ali, além dos filmes, suas estrelas. É uma identidade que foi se firmada pelo próprio festival nestes suas duas últimas décadas.

A cerimônia de abertura foi enxuta e rápida, distinta de outros momentos do Cine-PE, quando sempre reservava uma surpresa performática no palco do Teatro Guararapes, do Centro de Convenções.

Mas, na noite de abertura, aos menos cinco estrelas do cinema-tevê brasileiro(a) estavam alegrando seus fãs, ou apenas curiosos. Um era o homenageado Jonas Bloch, sua filha Débora Bloch, que lhe entregou o troféu Calunga; as atrizes Nathalia Dill, Paula Burlamaqui e o pernambucano Renato Góes.

O trio acima compunha o elenco de Por trás do céu, ficção do paulista Caio Sóh, que abriu a competição de longas misturando os tons entre fábula e a realidade. No enredo, Aparecida (Dill) vive com o marido Edvaldo (Ermilo Orciollo Netto) num deserto árido (locações em Lajedo, PB), onde, no tempo presente, recebem a visita de Micuim (Góes) em retorno de viagem a cidade grande.

Os regalos que Micuim trás da cidade para o casal amigo só estimula o desejo de Aparecida sair daquele lugar. Une-se ao trio a prostituta Valquíria (Burlamaqui) que foge de seu cafetão (Roberto Bomtempo) e passa a fazer o contraponto entre o tom fabular do trio contra o tom realista, que é também o da plateia que acompanha a história.

Um paralelo enredo – sobre o passado triste de Aparecida e Edivaldo – corre ao lado desse encontro do trio, sugerindo um drama em torno da necessidade de deixar o passado para trás e perdoar a si mesmo.

Dividido entre a intensidade das dores do drama e uma graça quase infantil e fabular, Por trás do céu cativou – mas não de imediato – o público do festival. Muito particularmente pelo perfil inocente (na verdade, quase débil) do núcleo Aparecida, Edivaldo e Micuim.

Em entrevista coletiva, Luís Carlos Merten, de O Estado de S. Paulo chamou a atenção para a construção de um Nordeste, de um sertão muito particular, que vem sendo criado em filmes como Por trás do céu, citandoReza e lenda e A luneta do tempo.

Ver o filme de Sóh no Cine-PE nos remeteu mais a um outro filme também lançado neste festival, só que em 2002. Era As três marias, de Aluizio Abranches, no qual o sertão vem embalado de um ideia pré-construída que necessariamente não casam com o espírito deste sertão, e contam com a força da locação como poder de convencimento dramatúrgico.

A mescla entre a idiotia e esperteza criada para Micuim, por sua vez, lembra um arremedo de um Didi Mocó com um Chicó, de O auto da compadecida, mas sem a mesma empatia de qualquer um destes dois.

Não se pode dizer que Por trás do céu é um filme infanto-juvenil – há violência gráfica -, e como produto adulto, quase fecha uma discurso divertido. O quase fica por conta dos excessos, seja na direção, seja na interpretação dos atores. O overacting até pode ser uma opção de composição, ou mais que isso, pode ser uma determinação do realizador, mas ela só será válida quando estiver caminhando lado a lado com a coerência e a unicidade dramática e discursiva do filme.

O prefeito
O carioca Bruno Safadi vem construindo um cinema intrigante e desafiador. Com seu O prefeito, longa exibido na noite 2 do festival (terça-feira, 03/05), Bruno reforça isso.

E é importante ver uma obra como O prefeito exibindo no Cine-PE exatamente por chamar a atenção para uma cinematografia que não apela para o óbvio, apostando na sugestão como ferramenta de reflexão política (particulamente no tempo político pelo qual passa o País).

Safadi coloca seu protagonista, o novo prefeito do Rio de Janeiro (Nizo Neto, íntegro por toda extensão do filme), com um serviçal em seu escritório – na verdade escritório representado por algumas mobília inseridas num canteiro de obras -, enquanto pensa numa maneira de entrar para a história.

Aos poucos vamos tomando pé de sua ideia em separar o Rio do Brasil, transformando-o num país independente. O absurdo não é mais absurdo do que a razão pela qual o político quer pôr seu plano em prática; ou seja, para tornar ele mesmo imortalizado na história – solução que Safadi resolve muito bem na conclusão de O prefeito.

Os encontros com a Alma Errante (Djin Sganzerla), uma entidade que o chama para a realidade fora do delírio do poder e que remete à figura de um mendigo (também Nizo), coloca o prefeito sob uma nova perspectiva mas não o suficiente para o desestimular de seu plano de vaidade.

O contraste do cenário em ruínas, e da pequena cidade de pedra que ele “cultiva” em seu escritório irreal, acabam por corporificar a dureza da realidade que cerca este homem louco. Assim como os que temos vistos diariamente nos noticiários da tevê.

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