18-jun-2016 (sábado)

LUIZ JOAQUIM*

FORTALEZA (CE) – Na sexta-feira (17), segunda noite do 26o Cine Ceará: Festival Ibero-americano de Cinema, o bloco inicial da programação, com quatro curtas-metragens, agregou filmes que, de alguma forma, apontavam para pessoas que merecem mais representatividade na sociedade como a conhecemos.

Alguns diziam isso em seu discurso de forma mais clara, como o gaúcho O Teto sobre nós, de Bruno Carboni (montador do longa Castanha), ou mesmo de forma estridente, como o paulista USP 7%, de Daniel Mello e Bruno Bocchini.

O primeiro a ser exibido, a ficção científica mineira Quando é lá fora, de André Pádua e Leonardo Branco, usou bem a imaginação e os artifícios da linguagem do cinema para falar de discriminação social.

Com poucos artifícios cenográficos e de figurino (é um filme de graduação em cinema), sugere uma sociedade futurista com humanos robotizados cuja identidade particular não pode ser confundida com a social. Quando uma mulher tenta burlar a regra, a punição é iminente.

Já a ficção O Teto sobre nós, o mais elaborado curta da noite, apropria-se de um real prédio abandonado em Porto Alegre e nós coloca próximo dos dramas pessoais de algumas pessoas que ali habitam sob a ameaça de uma violenta ação de despejo pela polícia. Bela fotografia em cinemascope e sons potentes emprestam a força do drama desse filme corajoso.

O documentário USP 7%, por sua vez, não está interessado em sutilezas. Não podia ser mais objetivo em seu discurso, formatando sua construção de maneira tradicional (nenhum problema com o –tradicional-) nesse documentário que reafirma o status conservador da Universidade de São Paulo, onde negros são minoria tanto entre alunos quanto em corpo docente.

USP 7% levanta uma discussão necessária, sempre, mas de forma não necessária a um festival de cinema, se consideramos que nesse ambiente o que se espera é encontrar também audácia audiovisual, e não apenas político-social.

O amor entre dois jovens rapazes, ilustrado em sua maior extensão com fotografias, é o ponto de partida (e chegada) do cearense Monstro, de Breno Baptista. A perspectiva é sempre a do jovem cearense sobre seu amor pelo paulistano, sofrendo pela dor da separação. As lembranças afetuosas e sexuais pontuam o texto em off dito pelo primeiro a cobrir os retratos do segundo, sendo sua lamentação pela perda do amor a pontuação deste filme que parece apreciar a própria dor, sugerindo um excesso desse próprio discurso da melancolia pela melancolia.

LONGA – o segundo longa em competição do Cine Ceará veio do México, pais homenageado este ano pelo festival. Epitáfio , de Rubén Imaz, segura sua dramaturgia inteira a partir de três personagens escalando o vulcão Popocatéptl , de 5.400 metros, no século 16.

O contexto é a busca da conquista da capital asteca Tenochilitán em 1519 por soldados do rei da Espanha. Dessa forma, acompanhamos principalmente a luta desses três homens – o capitão Diego (Xabier Coronado) e seus comandados Gonzalo (Martín Román) e Pedro (Carlos Triviño) – contra a natureza.

Aqui, a força visual da montanha dá o tom épico ao filme. Em sua amostragem daquele ambiente hostil, pela altitude, pelo frio, pela falta de vida, enfim, Epitáfio ganha mais e mais sua força.

A luta dos soldados espanhóis contra tudo isso – em nome de seu Rei – acaba sendo a luta também (boa luta) que o espectador trava vendo o filme.

No sentido da dificuldade dos atores em seu ambiente, destaca-se a fotografia cuidadosa e primorosa de Emiliano Fernandéz, que nos rememora um outro filme de um outro mexicano – Iñárritu, com seu O Regresso(2015)- que ganhou destaque na mídia pela dificuldades da locação.

A diferença é que em Epitáfio a natureza se apresenta mais verdadeira, mais honesta que em O Regresso, se é que é possível fazer tal analogia com comportamentos humanos.

*Viagem a convite do festival.