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Críticas

Entre Facas e Segredos

Não é para avaliar. É para montar um quebra-cabeça de 2.000 peças. E isso é divertido para os atentos.

Por Luiz Joaquim | 11.12.2019 (quarta-feira)

Que interessante encontrar nos cinemas um produto que entra discretamente em cartaz (discretamente para os padrões que envolvem sua produção e elenco) como é encontrar esse Entre facas e segredos (Knives Out, EUA, 2019), escrito e dirigido por Rian Johnson.

Isso porque temos aqui um belo exercício de investigação policial sobre uma morte, dirigido pelo mesmo nome que assinou o episódio VIII de Star Wars (Os últimos Jedis, 2017), domando um milionário elenco que inclui Daniel Craig, Chris Evans, Christopher Plummer, Jamiel Lee Curtis Michael Shannon, Toni Collette, Don Johnson, Jaeden Martell (de It: A coisa), Frank Oz e Ana de Armas (mais lembrada como a Joi, a holografia gigante que encanta Ryan Gosling em Blade Runner 2049).

A cubana Ana de Armas, a propósito, será vista também ao lado de Craig no novo 007, Sem tempo para morrer (estreia 9 de abril 2020), e antes, em 29 de janeiro, ao lado de Wagner Moura em Wasp Network, de Olivier Assayas.

Ainda que traga esses nomes pesados, Entre facas e segredos foi realizado com “apenas” 40 milhões de dólares e foi conquistando o mundo aos pouquinhos. De grão em grão, a galinha de Johnson já amealhou nas bilheterias, até o momento, mais que o triplo do que custou.

Sua mais recente conquista foram três indicações importantes para 77º Globo de Ouro (2020), incluído nas categorias de melhor filme cômico, melhor ator (Craig) e melhor atriz (Ana de Armas).

A jovem atriz, de fato, consegue segurar por todo o filme uma expressão que vai do sofrimento a fragilidade, passando por uma quase rebeldia e coragem com uma tenacidade extraordinária.

Craig, forçando um sotaque um tanto indefinido, como uma espécie de falso britânico, está francamente se divertindo aqui, como parece estar todo o resto do elenco que dança sob o ritmo de uma trama cujo engendramento é cada vez mais raro de se ver em Hollywood.

No caso, Craig vive o detetive particular Benoit Blanc (com tintas que podem lembrar o Monsieur Poirot de Agatha Christie). Famoso pela competência, com perfil publicado na The New Yorker, Benoit Blanc – que comicamente se refere a si na 3ª pessoal do singular – participa da investigação policial sobre o suposto suicídio de Harlam Thrombey (Plummer), encontrado morto no dia seguinte à festa de seu aniversário de 85 anos.

Harlam (Plummer) em seu 85º aniversário

Harlam, dono de um império editorial, mora numa mansão e é também um respeitado autor de romances de investigação policial. Na noite da festa, toda sua cavernosa e bajuladora família estava lá.

A primogênita Linda (Lee Curtis) e seu marido Richard (Don Johnson). O filho mais novo, Walt (Shannon), que administra a editora, a esposa (Riki Linkhome) e o filho adolescente do casal, Jacob (Martell), hipnotizado por redes sociais ativistas via smartphone. Estão lá também Joni (Collette), a nora e viúva de um já falecido filho de Harlam, com sua filha (Katherine Langford). Está também a mãe de Harlam, uma vegetativa mulher centenária que ninguém sabe a idade ao certo.  E está, ainda, a ovelha negra da família, o playboy Ransom (Evans), filho de Linda com Richard que, por ironia, é a pessoa mais parecida com Harlam.

De início, Entre facas e segredos apresenta todos esses personagens com uma eficiência notável uma vez que, junto a eles, apresenta também os potenciais motivos que tornariam cada um suspeito pela morte do patriarca. Mas… suspeito por um suicídio? A dúvida sobre a causa da morte de Harlam só se fundamenta no filme por um outro mistério. O detetive Blanc foi contratado anonimamente, por muito dinheiro, para acompanhar a investigação.

O mistério de seu contratante por si só o instiga (e a nós espectadores) a acreditar que há algo mais nebuloso do que se anuncia naquele suposto suicídio.

Craig (com Benoit) e Armas (como Marta)

Ana de Armas é Marta Cabrera, a enfermeira particular (mais do que isso, uma amiga) de Harlam. A origem latina da personagem é mote de piada (todos na família abastada confundem seu pais de origem) mas também dá espaço a uma boa cutucada política, quando o assunto é imigração. A personagem é mais do que isso aqui. Ela é a peça chave neste mistério. E isso fica claro desde o princípio na medida em que Benoit a convoca para ser sua ‘cara Watson’.

Infelizmente, Entre facas e segredos, ao final da trama, se coloca naquele lugar Scooby-Doo onde tudo é esclarecido numa longa fala descritiva do detetive particular. Mas, ainda assim, há lugar para reviravoltas. E, claro, o mais importante num quebra-cabeças tão bem escrito e dirigido por Rian Johnson não é chegar ao resultado final, mas sim envolver-se com o seu trajeto divertidíssimo e desafiante que está proposto a nós, espectadores desse espetáculo do bom entretenimento.

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