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Críticas

Cão sem Dono

Premiado

Por Luiz Joaquim | 13.07.2007 (sexta-feira)

Em janeiro, na 10° Mostra de Cinema de Tiradentes (MG), o cineasta Beto Brant foi eleito por 41 pensadores de cinema o melhor diretor brasileiro da década 1997-2007. Lá foi exibido “O Invasor”, como um dos três melhores filmes no mesmo período. O título para o realizador paulista não foi à toa. Hoje aos 42 anos, Brant estréia seu quinto longa-metragem “Cão sem Dono” (Brasil, 2007) – em co-direção com Renato Ciasca – no Cinema da Fundação (Recife), e é considerado aquele que mais e melhor se aproximou, na nossa cinematografia contemporânea, da realidade tão pujante quanto esquecida da nossa classe média.

Com “O Invasor”, passeou pela corrupção, (falta de) ética profissional e assassinato no nosso meio, entre os nossos vizinhos. Investigou, pela primeira vez de forma madura, a organicidade que há na nossa sociedade de castas sociais hibridamente interativas. Em “Cão sem Dono” a mesmo classe média, agora personificada pelo gaúcho Ciro (Júlio Andrade) vive outro drama. O foco é mais pessoal, mas não menos social.

Ciro, 25 anos, formado em Letras, recebe em seu solitário e vazio apartamento dois novos seres vivos transformando a inércia sem perspectivas em que se encontra sua vida. Um é o vira-lata que passa a segui-lo na rua e o outra é Marcela (a bela Tainá Müller, melhor atriz no Cine-PE e em Cuiabá), uma modelo em ascensão, determinada em administrar muito bem sua carreira.

Apesar de, no filme, a atitude dos personagens ser menos potente que as impressas no livro que lhe deu origem – “Até o Dia em que O Cão Morreu”, de Daniel Galera – a adaptação de Brant não deixa nada a desejar no quesito dramaturgia e narrativa cinematográfica. Pelo contrário. Um primeiro ponto a ser considerado é a atuação visceral de Andrade e a descontraída de Müller (que é companheira de Galera). É evidente que os atores têm seus méritos próprios, mas não se pode desconsiderar a mão de Brant e Ciasca estipulando o tom da intensidade das emoções, que aqui não são poucas.

Não é fácil expor em imagens, e depois encadeá-las, sentimentos contidos como os que Ciro carrega consigo, vagueando entre seu cachorro e sua Marcela. E nisso Brant e Andrade são bem competentes. Pequenos detalhes inseridos no filme (e fora do livro), como a conversa sincera de Ciro com seu pai sobre drogas e como encontrar o eixo da própria vida, ou na conversa baixinha e romantica de Marcela, na cama, pedindo a Ciro para falar qualquer coisa bonita para ela, são exemplos a serem seguidos da combinação afinada entre boa atuação, bom diálogo e a simplicidade em um plano bem executado, no caso, realizado pelo fotógrafo Toca Seabra. Boa parte do crédito dessa naturalidade alcançada também se deve a ajuda do Clube do Silêncio, competente produtora de Porto Alegre, onde o filme foi rodado.

Mesmo com as várias qualidade bem definidas e facilmente identificáveis, “Cão sem Dono” prima mesmo é pelo seu conjunto. Uma vez acompanhando os percursos de Ciro – que é o reflexo de toda uma geração contemporânea sem norte, ainda sob a sombra de uma tardia postura adolescente – o espectador não consegue se desgarrar do que se desenrola na tela. É como se Ciro, o cão sem dono em pessoa, Marcela, a luz desse cão, e o próprio cachorro do filme fossem os mais novos amigos dos espectadores, para quem se vai torcer como se torcesse para si mesmo.

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