O Homem que Desafiou o Diabo
O nordestino, mais uma vez, pelo olhar carioca
Por Luiz Joaquim | 28.09.2007 (sexta-feira)
Moacyr Góes é acusado pela direção de “Dom” (2003), “Um Show de Verão” (2004) e “Trair e Coçar É só Começar” (2006), entre outras três produções com Xuxa. Ele volta a ocupar as salas de cinema agora com “O Homem que Desafiou o Diabo” (Brasil, 2007). Uma espécie de colagem de vários “causos” registrados no livro publicado em 1986, “As Pelejas de Ojuara”, de Nei Leandro de Castro, escritor de Natal. A adaptação foi trabalhada pelo próprio Góes.
Encabeçando o elenco está Marcos Palmeira como um nordestino vendedor de tecidos chamado Zé Araújo – no Nordeste, a profissão deste personagem aliada ao seu nome já suscita questionamentos. Mas Zé Araújo decide virar Ojuara (Araújo ao contrário) quando descobre que o município onde vive com sua mulher Dualiba (a pernambucana Lívia Falcão) caçoa de sua pessoa, como quem caçoa de um sujeito dominado pela esposa e pelo sogro.
Na transformação, Ojuara passa a ser o macho mais valente do pedaço e sua fama corre o sertão. Mas Ojuara, mulherengo e justo – assim quer vender o filme – só pensa em chegar em São Sarué, onde tudo é doce, farto e fácil. No meio do caminho, Ojuara vai digladiando com valentes (Otto e Leandro Firmino da Hora, o Zé Pequeno), entidades do mal como Mãe Pantanha (Flavia Alessandra, mostrando seu maior talento, coberto por pouco tecido) e o próprio diabo, aqui Cão Miúdo (o ótimo Helder Vasconcelos, ex-integrante da banda Mestre Ambrósio).
Da mesma forma como o “O Homem que Desafiou…” dá espaço para muitos figurantes – nesse rol aparecem também Leon Góes, a revelação do filme, interpretando o feio corcunda casado com Mãe Pantanha – seu desenvolvimento narrativo parece uma concha de retalhos, como se vários cordéis tivessem sido encadeados, e por isso mesmo frágil na definição dos personagens. São como vários esquetes, supostamente engraçados, com o Nordeste e o nordestino ao fundo.
Numa de suas primeiras falas, Zé Araújo, ao ver passar uma moto comenta desajeitado: “Êita bicha bonita da gota serena!”. Talvez o sotaque e a expressão soem convincente para quem mora em Caxias de Sul ou em Lisboa, onde as novelas da Rede Globo são exibidas. Para recifenses é difícil engolir. Tudo bem que o tom aqui é o do exagero, da pantomima, mas se é assim, também é problemático uma vez que não há unicidade no filme. Fica fácil de explicar quando escutamos Lívia Falcão fazendo muito bem sua Dualiba, uma quarentona no interior do Nordeste, virgem e afetada para “tirar o atraso”.
Palmeira se esforça e merece crédito, mas, por questões que estão fora de seu alcance de controle, mas ao alcance de Moacyr Góes, podemos vê-lo aqui, Palmeira, como o mesmo caboclo que interpretou em “Pantanal”, há 18 anos atrás. Aparece numa lagoa, pelado, claro, desta vez com Fernanda Paes Leme.
Em material de divulgação, Góes insiste em dizer que vê Ojuara como uma espécie de encerramento de uma trilogia de personagens pitorescos formados por “Macunaíma” e Vadinho, de “Dona Flor e Seus Dois Maridos”. É difícil acreditar que a história irá confirmar isso no futuro.
Muito embora não seja necessariamente um elogio, pode-se dizer que, sob a mão forte dos produtores Luiz e Lucy Barreto, “O Homem que Desafiou o Diabo” é o trabalho melhor acabado de Moacyr Góes. Quem quiser tirar a prova…
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