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Críticas

As Viagens de Gulliver

Personagem enorme, carisma nem tanto

Por Luiz Joaquim | 04.01.2010 (segunda-feira)

Que ironia. Há seis anos, o ator Jack Black interpretou um empresário que capturava um gorila de 15 metros e o explorava como atração em Manhattan. Hoje estreia “As Viagens de Gulliver” (Gulliver’s Travels, EUA, 2010), filme de Rob Letterman, no qual Black vai parar numa ilha no Triângulo das Bermudas e é visto como um gigante de 30 metros capturado por micro-homens. Quem já leu o clássico homônimo da literatura escrito por Jonathan Swift em 1725, sabe do que estamos falando.

Mas cuidado com a sede com a qual você vai chegar aos cinemas para ver essa adaptação pois, na verdade, muito pouco da essência do romance – escrito por Swift mais para agredir o mundo que para entretê-lo – será visto na tela. No romance, o que existe é amargura, ressentimento. Uma misantropia, talvez. O que está lá é uma crítica feroz sobre a mesquinhez humana e soberba em função do poder.

No livro, o náufrago Gulliver passa por três lugares que moldam seu caráter. No primeiro ele é um gigante numa ilha de habitantes pequeninos, depois vai parar noutra, onde ele é o minúsculo da história. Na sequência, chega a uma ilha voadora e por fim, passa a conviver com uma espécie de cavalos livres da maldade humana, como a inveja e a mentira. Acontece que apenas a presença de Gulliver naquele meio é o suficiente para macular aqueles animais limpos, distorcendo a harmonia da comunidade. Quando volta ao seu mundo, Gulliver está tão incomodado com os homens e seus defeitos que os afasta de si.

É evidente que Hollywood não só descartou (ou aproveitou muito, muito pouco) toda essa carga de auto-reflexão humana, como salientou ao extremo o que há de aventuresco nela. Estando Jack Black encabeçando o elenco (e outras estrelas como Amanda Peet e Emily Blunt), mas particularmente Black, já aponta para onde “As Viagens de Gulliver” quer chegar.

Black é o sujeito da expedição de um grande jornal. Ele entrega a correspondência aos jornalistas da casa e é apaixonado pela editora de turismo (Peet) a quem engana (por desespero para ficar próximo) dizendo-se um especialista em textos de viagens. Sob pedido da amada, ele vai parar na tal ilha onde habitam os micro-homens, os ‘liliputianos’ e lá vira herói, bom exemplo e com isso ganha auto-estima.

Carregado com a própria idiossincrasia de Black, o filme apresenta os mesmos elementos vistos em outros trabalhos em que ele esteve na produção, como “Nacho Libre” (2006) ou “Escola do Rock” (2003). É um universo pop, balizado pela música e pelo cinema arrasa-quarteirão.

Mesmo com o foco na meninada, mas também de olhos nos pais dessas crianças-espectadores, “As Viagens…” parece não funcionar muito bem. Mesmo os efeitos especiais, aqueles que poderiam ser o melhor do filme (considerando o descaso com o drama original), também não encantam. O tratamento do gigantismo de Black é apenas correto. O efeito 3D, inclusive, parece uma brincadeira de mau gosto, considerando que ele quase não existe em boa parte do filme. Quer testar? É só tirar o óculos durante a sessão por várias vezes.

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