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Entrevistas

Entrevista: Halder Gomes

Um filme joiádo

Por Luiz Joaquim | 11.07.2013 (quinta-feira)

A programação da mostra de 15 anos do Cinema da Fundação Joaquim Nabuco reserva para a sessão das 18h30 de hoje uma pérola do humor e da provocação. A provocação começa já no título do filme – “Cine Holliúdy” (escrito assim mesmo).

Nele, o diretor cearense Halder Gomes nos brinda com uma história de amor pelo cinema. O herói aqui é Francisgleydisson (Edmilson Filho) que, no interior do Ceará dos anos 1970, sonha em montar seu próprio cinema para exibir filmes de Kung-Fu.

Recheando este enredo, Halder – que vem hoje ao Recife especificamente para um debate com o público após a sessão – nos brinda com a graça do linguajar “cearencês” que, de tão cifrado, em alguns momentos nos chega pelo filme auxiliada por legendas. Muito mais do que uma divertida peça de curiosidade, “Cine Holliúdy” denota a competência de Halder como cineasta.

Ex-lutador de artes marciais, ele trabalhou como dublê em Hollywood. Daí a paixão pelo cinema não cessou. Começou dirigindo o longa-metragem “Sunland Heat” (2004), depois rodou nos EUA o terror “The Morgue” (2008), e de volta ao Brasil produziu “Bezerra de Menezes: O Diário de Um Espírito” (2008) e “Área Q” (2012), além de ter co-dirigido “As Mães de Chico Xavier” (2011). Isso sem contar seus curtas-metragens, que rodaram mais de 50 países.

Ainda do Ceará, Halder concedeu esta entrevista sobre as curiosidades de seu “Cine Holliúdy”. Acompanhe.

ENTREVISTA: HALDER GOMES

Antes deste filme você dirigiu três longas-metragens: um de ação, um suspense e um drama. Mas podemos dizer que “Holliúdy” é seu projeto mais pessoal?

É o mais autoral entre os longas. É aquele que mais traz identificação com minha vida. Por ser um longa, pude inserir muitas das coisas das quais tenho um interesse particular. A vida no interior, os filmes de arte marciais, o futebol e meu senso de humor. Mas há também outras referências mais subliminares, com relação à pintores barrocos, seja pela cor, seja pelo enquadramento. A própria trilha sonora também reflete os cantores por quais tenho paixão, como Márcio Greyck, Paulo Sérgio, Diana. São ícones de nossa música que eu escuto. Eu tive total liberdade de criação. É raro fazer um filme assim. A limitação do orçamento não me impediu de contar o que eu queria contar, apenas precisei me adequar a ela.

E a ideia de pôr legendas para traduzir o “cearencês”?
Nos amplificamos o regionalismo. Mas o filme deve e pode circular em qualquer lugar. Se os diálogos soam estrangeiro para alguns, aí é só ir pra legenda.

Como surgiu a ideia para criar Francisgleydisson?
Aqui no Ceará o povo tem essa coisa de juntar três nomes em um só. Eu sempre tive uma mania de ler o nome das pessoas no resultado do vestibular. E me divertia. Como construção do personagem, ele é um pouco um alter ego. Assim como ele, eu tenho de fazer muitas coisas ao mesmo tempo. No cinema então, eu sou diretor, produtor, finalizador. E faço por necessidade. O universo não colocou nada na mão do Francisgleydisson. E mesmo assim o cara se safa, é um desenrolado. Para ele não tem tempo ruim.

Em que lugares o filme já foi exibido. E como foi a reação no exterior?
Exibiu primeiro no Cine Ceará de 2012, depois passou no Festival de Brasília, no Festival do Rio, Mostra de SP e na Mostra de Ouro Preto. No exterior exibiu em Bangcoque, em Lisboa e em Los Angeles. Percebo que independe do lugar onde ele passa, o público embarca na história. Isso por conta da linguagem do cinema. Independente do lugar, o humor funciona. Mais em alguns lugares, funciona menos que em outros. Pelo drama é mais fácil conquistar, pois algumas chaves fazem você chorar em qualquer lugar. Percebo que “Holliúdy” vai mais de acordo com a classe social da platéia do que com sua posição geográfica. Na Mostra de SP, por exempo, com seu público de cinéfilos, eles riram muito num momento que não provocou tanto riso no Cine Ceará.

Cine Holliúdy encontrou preconceitos em função do “cearensês”? Como vendeu o projeto para ganhar distribuição nacional?
Olha, tenho formação em administração e pós-graduação em marketing. Aqui eu visei um nicho. Tive um laboratorio muito interessante que foi meu curta-metragem “Os Astista contra o Caba do Mal” [escreve assim mesmo] e com ele tive a oportunidade de correr o mundo. No longa-metragem, eu sabia que encontraria barreiras para que entendessem a universalidade de nosso regionalismo. Mas eu tinha um plano de mercado; até que encontrei Bruno Wainer [da distribuidora Downtown], cujo olhar é apurado para o mercado. Eles abraçaram o projeto como um “case”. Talvez estejamos abrindo um novo nicho, que é o do mercado regional.

Como vai funcionar a distribuição nacional?
Primeiro vamos estrear o filme no Ceará [9 de agosto], e depois no Norte/Nordeste, até ir avançando nos outros estados. Se lançamos aberto [nacionalmente], o risco é maior. Aqui no Ceará tenho como mobilizar o público, daí podemos chegar nos outros lugares como um fenômeno local e diminuir os riscos.

Como definiria a situação atual do setor audiovisual no Ceará?
Hoje os realizadores vivem um momento único. Tem muita gente boa aqui. Das mais distintas gerações, criando conteúdos diversos e conseguindo entrar tanto em festivais como no circuito comercial. O que acontece é um contraponto ao que o nosso Estado investe no audiovisual. O Ceará come mosca e não enxerga os lugares onde o cinema pode chegar e vender a imagem do Estado. A visão que o governo de vocês [de Pernambuco] tem sobre isso, faz do governo do Ceará um míope. É uma pena, pois podíamos estar indo ainda mais longe.

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