
29º Cine de Lima (2025) – Punku
Apichatpong na Amazônia peruana
Por Ivonete Pinto | 14.08.2025 (quinta-feira)

Apichatpong Weerasethakul baixou no Perú. O diretor tailandês, que já esteve duas vezes no Festival, é possivelmente a principal influência de Punku (Perú/Espanha, 2025), que concorre a melhor filme na competição latino-americana de ficção. Espíritos da floresta, mistérios, lacunas, códigos culturais que o público destas bandas não consegue adentrar. Mesmo assim, ou por causa disto, o filme, com roteiro e direção do peruano Juan Daniel Fernández Molero, consegue provocar um certo fascínio. Ajuda muito a fotografia em película 35mm, que mescla preto e branco e cor, e uma montagem experimental, fragmentada, que não facilita a compreensão do enredo, o que, por si, não seria um problema.
Ecos de Lucrécia Martel também podem ser sentidos (A Mulher sem Cabeça, sobretudo), além de um Joshua Oppenheimer (O Ato de Matar). Este último, pode ser a referência mais inusitada e, se de fato existe, localiza-se somente em uma sequência em que candidatas a um concurso de beleza dançam na beira de uma cachoeira. Um diretor “de cena” dando ordens, aos berros, para sensualizarem.

Entre a floresta e o palco, Punku alterna mistério, concurso de beleza e tramas que não se encontram.
A candidata é Meshia, adolescente indígena Matsigenka (Maritza Kategari), que, num ato de bondade pois não o conhece, leva o adolescente Iván (Marcelo Quino) rio acima, em direção à cidade de Quillabamba, na região de Cusco. Ela o encontra meio desacordado, sem falar uma palavra, e com um olho em processo de infecção. O olho teria sido arrancado em algum ritual. Na cidade, ele passa por uma cirurgia e Meshia, enquanto espera no hospital, é convidada a participar do tal concurso. O que temos então é o enredo ora se ocupando com o misterioso rapaz que foi atacado, ora com os preparativos para o concurso. No meio disto, uma casa noturna onde Meisha é acolhida e que serve de pretexto para a inclusão de meninas que são (ou não são) exploradas. E ainda, com destaque, um outro personagem misterioso, com direito a chapéu de abas largas e planos a contraluz, e que é dado a comer carne humana (ou assim o parece).
Iván, quando o foco está com ele, é perturbado por pesadelos que mais confundem do que explicam o que aconteceu. E pesadelos, sabemos, são os momentos em que cineastas experimentais mais prezam para suas investigações de linguagem.
Estamos na Amazônia peruana, cenário cujos sons, iluminação e cores carregam em si toda sorte de possibilidades sensoriais. O diretor Juan Molero explora bem esse ambiente. O problema é que os subtemas, o homem sinistro que não se assume, as falsas pistas, as sequências sem função dramática, fazem deste um filme excessivo. Até mesmo na duração, pois tem 132 minutos nos quais o filme não consegue o adensamento que ambiciona.
A relação de Meshia com Iván, que se anuncia como uma conexão espiritual forte, não avança. Uma relação, aliás, que faz lembrar a enfermeira de Cemitério do esplendor (2015), de Apichatpong. Influência mais explícita, inclusive pelas cenas no hospital. Mas desaponta ao não conectar os universos do concurso de beleza, com suas músicas e figurinos, o adolescente que perdeu o olho, as mortes, o homem/assassino misterioso. A Amazônia, como pano de fundo, teria mais a oferecer.
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