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Reportagens

Os piores de 2020 – Jaca Awards?

Convidamos cinco especialistas para apontar cinco papangus cinematográficos que nos assombraram em 2020

Por Luiz Joaquim | 27.12.2020 (domingo)

O CinemaEscrito não é afeito às listas revisionistas ou de final de ano, mas 2020 foi tão enviesado que resolvemos arriscar uma para distrair nossos leitores.

Tendo sido um ano (ainda não acabou, né?) de tantas desventuras e infortúnios para milhões no mundo inteiro, resolvemos tentar descontrair listando alguns dos filmes que ajudaram a tornar 2020 ainda mais inesquecível, no mau sentido.

Quais foram os filmes que maltrataram nossa sensibilidade, ou mesmo inteligência? Nossa benevolência, paciência, generosidade…. bem, você que decide qual substantivo usar.

Para a brincadeira, convidamos cinco respeitados/as colegas que trabalham seriamente debruçados/as sobre o cinema, produzindo reflexões o ano inteiro, para que apontassem cinco trepeças cinematográficas que aporrinharam o espectador em sua sensibilidade, inteligência, benevolência, paciência, generosidade, etc, etc.

Nos ajudaram aqui, em ordem alfabética, Chico Fireman, Flávia Guerra, Francisco Carbone, Marcelo Müller e Mariane Morisawa, a quem agradecemos imensamente por topar a brincadeira.

Segue, abaixo, uma seleção no espírito que faria o “Framboesa de Ouro” (ou Razzies awards) – a famosa premiação paródica norte-americana ao Oscar, que é oferecida aos piores do ano. A propósito, em 2021, o Razzies já vai realizar sua 40ª edição.

Nosso país, já há algum tempo, também merece uma versão brasileiro para a brincadeira. Poderíamos ter, talvez, o Jaca awards, contemplando as mais diversas categorias cinematográficas que enfiaram o pé-na-jaca em suas performances no ano corrente e, de lá, saíram com o pé fedido.

Mas sendo a realidade audiovisual no Brasil anos-luz distante da realidade norte-americana – particularmente nos últimos quatro anos – há um consenso profissional (como havia à época da extinção da Embrafilme em 1990) de que se há algo que o nosso cinema não precisa no momento é de desestímulo. Logo, o leitor irá perceber que aqui quase não há título nacional listado.

Nessa brincadeira, que poderíamos batizar de 1º Jaca Awards: os piores de 2020, aparecem algumas concordâncias. São títulos que figuram em mais de uma das listas dos cinco filmes desconjuntados do ano, como o CinemaEscrito solicitou aos cinco votantes. São eles: Doutor Dolittle; Downhill;  Cats; Era uma vez um sonho; 365 dias; e A festa de formatura.

Conheça, abaixo, com breves comentários de nossos colaboradores, os papangus do cinema em 2020.

“Era uma vez um sonho”

Chico Fireman (@filmesdochico / filmesdochico.com.br/ cinemanavaranda.com)

Os órfãos – Destrói um clássico.

Era uma vez um sonho – Piegas. Ron Howard conseguiu uma proeza raríssima em “Era uma Vez um Sonho”: Amy Adams e Glenn Close estão péssimas.

A festa de formatura – Ryan Murphy e seu maravilhoso talento para o genérico. Insípido.

Sérgio – Não consegue nem ser um filme político, nem dar a dimensão do personagem, nem convencer como história de amor.

Bill & Ted: Encara a música – Decepcionante retomada da franquia.

 

“365 Dias”

Flávia Guerra (@flavesguerra / @planogeral_podcast )

A última coisa que ele queria – O que pode dar errado em um filme dirigido por Dee Rees, estrelado por Anne Hathaway, Ben Affleck, Willem Dafoe? Pois é. Tudo. O filme teve uma première linda em Sundance, a plateia foi para gostar, mas a história é tão rocambolesca que, infelizmente, não funcionou. Mas amamos o cinema da Dee Rees e torcemos para que ela filme mais e acerte da próxima vez.

365 dias – Não. Apenas não. Premissa surreal, locações incríveis e elenco lindo. Mas não, nem para distrair os mais entediados e confinados durante a pandemia, podemos aprovar um roteiro que normatiza uma relação que começa abusiva e assim segue, além de ser o cúmulo da cafonice.

Downhill – Hollywood tem a infeliz mania de adaptar para o gosto norte-americano sucessos do cinema mundial. E no caso do genial sueco “Força Maior” não foi diferente. Na adaptação dirigida por  Nat Faxon e Jim Rash, que estreou em Sundance, Julia Louis-Dreyfus e Will Ferrell (re)vivem a história do casal que passa férias tranquilas em uma estação de esqui até que uma avalanche acaba com a paz vigente. Precisava de uma versão hollywood? Não, não precisava.

Cats – Cats chegou ao circuito no final de 2019, quando o mundo era (quase) feliz pré-pandemia. Mas, como a grande maioria dos espectadores só assistiu no início deste ano tão esdrúxulo, vale ser incluído na safra 2020 de “flops”. Dos efeitos mal acabados ao ritmo que não se encontra, infelizmente, não funciona.

Dolittle – Mais um caso em que nada pode dar errado. Diretor promissor (Stephen Gaghan, roteirista dos oscarizados Traffic e Syriana), elenco de luxo ( Robert Downey Jr., Jim Broadbent, Antonio Banderas, Michael Sheen) e uma história de sucesso a ser revisitada. E novamente um caso de “precisava? Não, não precisava investir 175 milhões de dólares”.

“Cats”

Francisco Carbone – (@frankacarbone / cenasdecinema.com)

O limite da traição – Com Tyler Perry, não há dúvida: a garantia de assistir uma bomba é assegurada. Mais uma vez ele cumpre o que promete, lançar sempre o pior filme do ano com muito orgulho.

A marca do demônio – Foi difícil decidir entre ambos, filmes igualmente inexplicáveis em suas ausências absolutas de qualidades. Aqui, ainda temos as questões técnicas que não deram as caras, e um clímax impressionantemente ruim.

A possessão de Mary – Relutei em incluir dois filmes de terror na lista, mas esse aqui vai para categoria plus “envergonhando seu Oscar” – porque Gary Oldman aceitou fazer um filme de barco “possuído” por um espírito, quase a ganhar a vida?

365 Dias – É complexo fazer uma lista dessa; você aponta surpresas ou chuta cachorros mortos? Essa dúvida me vem especialmente ao apontar esse título, que tem tantos graves problemas (machismo, misoginia, romantização da violência contra a mulher, tudo com invólucro chique) que provoca no espectador inúmeras gargalhadas de nervoso, ao mesmo tempo em que você quer saber onde vai dar todo o horror.

Cats – Ainda que lançado no Natal passado, a maior parte dos espectadores dessa obra foi esse ano. Logo, como deixar passar esse manancial de vergonha alheia por metro quadrado? Em quinto ou em primeiro, ‘Cats’ é inesquecível, e uma prova de que coragem não impede a falta de bom senso. Afinal, daria certo adultos vestidos de gatos rodopiando em produção irremediavelmente brega?

“Downhill”

Marcelo Müller / (papodecinema.com.br)

Downhill – A ideia de fazer um remake de Força Maior com Will Ferrell e Julia Louis-Dreyfus, por si, já antecipa a tragédia. Afora a comparação, o filme é ruim, sem graça e tal, mas colocado lado a lado com o sueco ele empalidece até ficar da cor da neve dos alpes suíços.

Espada da vingança: Até a última linha – Um filme de espera, em que um grupo heterogêneo aguarda a chegada do inimigo. Já vimos isso em filmaços e agora nesse longa bem qualquer coisa de trama confusa, no qual os personagens conversam como se soubéssemos tudo o que eles sabem. Isso sem contar os defeitos especiais.

Amiga do inimigo – O representante brasileiro. Continuação de uma websérie estrelada pela youtuber Vihh Tube, esse filme é um amontoado de lugares-comuns de comédia romântica escolar, com interpretações ruins e uma falta quase completa de senso de apropriação dos clichês. Além disso, e principalmente, o filme é leviano diante dos temas que aborda.

A maldição da ponte – Mais um maltrato com o horror, esse taiwanês nem se dá ao luxo de brincar com as lendas urbanas, desde o começo incorrendo numa lógica semi-paródica, mas só que involuntariamente. A tensão não funciona, os personagens são ruins e ao invés de medo/apreensão, o filme dá sono.

Fanático – Esse é daquele tipo “tiro saindo pela culatra”. John Travolta deve ter imaginado que poderia ser premiado com um filme em que ele vive um stalker extremo. Até que ele não se sai mal nos primeiros minutos, mas depois o filme é tão desconjuntado que ele se torna uma caricatura sem o mínimo de peso dramático.

“Doutor Dolitlle”

Mariane Morisawa (@mmorisawa / jornalista, colaboradora de O Estado de S. Paulo e revista Claudia)

Era uma vez um sonho, de Ron Howard – Ron Howard não é um grande diretor, mas já fez alguns filmes de forma competente. Este é uma desgraça. O longa é baseado nas memórias de J.D. Vance, de 2016, que viraram uma espécie de guia para explicar os brancos e pobres devastados pela epidemia do vício e que votaram em massa em Donald Trump. A produção vê tudo como um fio de miséria e ignorância com alguns momentos de ternura no meio. Mesmo as suas duas grandes atrizes, Glenn Close e Amy Adams, não conseguem salvar o filme.

O pássaro pintado, de Václav Marhoul – Esteticamente, o filme do diretor tcheco é belíssimo. Mas as histórias de tragédias da Segunda Guerra Mundial no Leste Europeu, baseadas nas contestadas memórias do polonês Jerzy Kosinski, são uma coleção de crueldades e do pior do espírito humano. Praticamente ninguém se salva na trajetória do menino judeu. As mulheres são perversas ou malucas. Há uma tradição de filmes da região serem explícitos ao tratar do tema. Mas é necessário mostrar um estupro com garrafas sob o ponto de vista da estuprada? Com sua maneira de filmar, o diretor acaba afastando o espectador em vez de fazê-lo compreender o horror da Segunda Guerra.

A festa de formatura, de Ryan Murphy – O diretor é conhecido por suas produções pop, envoltas em neon e brilho, muitas tratando da dificuldade de ser da comunidade LGBTQ. É evidente a razão pela qual ele quis fazer essa adaptação de um musical da Broadway inspirado na história real de uma escola que cancelou o baile de formatura para impedir a participação de uma aluna gay. Mas a verdade é que o musical em si não é grande coisa, com canções medíocres que geram números ainda piores. O elenco estrelado – Meryl Streep, Nicole Kidman – se esforça para dar graça à produção, que finge criticar a Hollywood liberal para depois dizer como filmes mudam vidas. Eles devem ter se divertido. O espectador, nem tanto.

Doutor Dolittle, de Stephen Gaghan – Houve diversas adaptações das obras de Hugh Lofting sobre um médico capaz de conversar com animais, inclusive três produções estreladas por Eddie Murphy. Esta aqui se beneficia de efeitos visuais muito mais elaborados, um elenco de primeira, mas lhe falta graça. Robert Downey Jr. está mais canastrão do que nunca.

Sócias em Guerra, de Miguel Arteta – Outro filme que tem um bom elenco desperdiçado – o trio principal, formado por Tiffany Hadish, Rose Byrne, Salma Hayek, além de coadjuvantes de brilho próprio, como Billy Porter, Jennifer Coolidge e Natasha Rothwell. Mesmo que a amizade entre Mia (Haddish) e Mel (Byrne) tenha seus momentos, o filme cai no clichê de colocar uma contra a outra por influência de uma terceira mulher, uma magnata da indústria de cosméticos interpretada por Hayek. O que supostamente é uma comédia empoderada acaba caindo no clichê da rivalidade feminina, com piadas sobre sexo e órgãos sexuais supostamente modernas apenas por saírem das bocas das mulheres.

“A festa de formatura”

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