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Críticas

O Comedy Club

Você vai conhecer o mais ilustre cidadão de Xambyvydadde. É o que?

Por Luiz Joaquim | 27.10.2022 (quinta-feira)

Em termos culturais, os tocantinenses devem estar duplamente orgulhosos nesta quinta-feira (27). Primeiro porque O comedy club (Bra., 2022), de André Nascimento, é o primeiro longa-metragem realizado no estado mais novo do país que chega (hoje) ao circuito exibidor nacional. Além de exibir em Tocantins, o título chega às salas de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Amazonas, Paraná, Paraíba, Goiás, Minas Gerais, Pará e do Distrito Federal.

Esse feitio – um longa de um estado com pouco mais de 30 anos de existência e sem tradição audiovisual ser comercialmente distribuído no Brasil – é, por si só, uma grande façanha. Façanha cuja dimensão talvez só seja compreendida por quem trabalha no segmento da distribuição ou da exibição de filmes neste país.

Pôster oficial

Já o segundo motivo de orgulho dos tocantinenses está, propriamente, em O comedy club. Isso porque a comédia dramática (ou o drama humorado) de Nascimento é uma muito despretensiosa e tocante aventura de um nortista que vai a São Paulo tentar a sorte e lá descobre que possui um talento adormecido.

Esse talento é o humor. Um humor natural. Algo, aliás, que não surpreende àqueles que nascem e vivem no Norte e Nordeste deste Brasil. Mas que surpreende os suldestinos de O comedy club.

Nosso herói é Daniel (Manoel Medeiros), nascido no interior do Tocantins, no município de Xambyvydadde (escreve assim mesmo). Quando chega à capital paulista para trabalhar como garçom num clube de stand-up, ao lado do primo já lá empregado, conhece o comediante Paulo Carvalho (o próprio Carvalho, um dos pioneiros do formato) que percebe a leveza e o potencial do nortista.

Paulo oferece uma oportunidade para Daniel fazer a abertura de um profissional da casa e está dada a largada para a ascensão do xambyvydaddense como comediante, mas não sem muito estudo e dicas sopradas pelo novo amigo experiente, além de outros talentos do ramo como Júnior Foppa (como ele mesmo)

Mas antes do sucesso, Daniel precisa voltar à terra natal para cuida da mãe doente e lá, onde o vento faz a curva, decide usar o que aprendeu em São Paulo para inaugurar um clube de stand-up comedy, o ‘comedy club’ do título.

Para tanto, precisa de um endereço e de um elenco divertido. Vai parar nas ruínas da igreja de Genevaldo (Foppa) e reúne a popular fofoqueira da cidade, Lurdinha (a brasiliense Nathalia Cruz, do ‘Porta dos Fundos’), aquele que ninguém entende uma palavra do que diz, Seu Benedito (Bruno Barros), e um garçom vesgo além do próprio Genevaldo como mestre de cerimônias e, ainda, a Zoé Boca Suja (Cinthia Abreu).

O Comedy Club, embalado pelo teclado de Lailtinho (Brian Castro), vira um sucesso até que o corrupto prefeito Malaquias (Paulo Carvalho, caracterizado) manda fechar o estabelecimento por conta das piadas contra o seu mandato, além de prejudicar a campanha de seu filho, Júnior Júnior, pelo partido de número 71 (ou, 17 invertido). Fazendo gesto de ‘arminha’ com a mão, Jr. Jr. é candidato a ser o sucessor do pai Genevaldo na prefeitura.

Aqui um parêntese para a performance de Carvalho como Genevaldo que, caracterizado como uma espécie de coronel nortista, ignorante e grosso como um papel de embrulhar prego, além homossexual enrustido, arranca sorrisos do espectador com facilidade.

Carvalho como o prefeito Genevaldo

Sem soar ofensivo, vale dizer, Carvalho carrega no histrionismo, o que, no contexto de O comedy club, encaixa muito bem. Ele poderia estar no elenco de qualquer filme de Halder Gomes, por exemplo, que estaria bem.

A propósito do cinema de Halder Gomes, não vá o leitor pensar que O comedy club seria uma versão tocantinense para o cearense Cine Holliúdy.

Ainda que haja pontos em comum – afinal, estamos falando de um desvalido que decide abrir um estabelecimento cultural numa pequena cidade interiorana –, o diretor e roteirista André Nascimento, como dissemos anteriormente, vai se equilibrando aqui entre o drama e o humor e faz de seu Daniel quase um anti-Francisgleydsson (protagonista de Holliúdy)– a começar pelo nome de seu herói, ‘Daniel’, um dos poucos em Xambyvydadde sem Y e sem dois ‘D’ na grafia.

Já o ator Manoel Medeiros empresta ao seu Daniel, sem histrionismo, uma simplicidade humana (no melhor que o termo pode carregar) boa e rara de ver no cinema brasileiro contemporâneo. Na primeira parte de O comedy club, em São Paulo, o ator seduz pela forma como constrói um personagem fundido num misto de gentileza e tranquilidade – o que só ajuda a tornar mais crível o encanto estabelecido pelo enredo com qual o naif Daniel conquista a todos na capital paulista.

Os tocantinenses Daniel (Medeiros, em primeiro plano) e o primo encaram ‘Sumpaulo’

A primeira parte do filme peca apenas, talvez, por uma excessiva inserção de imagens aéreas de São Paulo (belas imagens!), que talvez estejam lá para reforçar o deslumbramento ou, pelo contrário, o temor de Daniel diante de um mundo tão gigante onde ele é apenas mais um.

Ainda que tenha sido essa a pretensão, o recado parecia ter sido dado já há algumas sequencias atrás.

Uma curiosidade: Manoel Medeiros, até ser escalado para atuar em O comedy club, trabalhava como mecânico profissional e palhaço amador em hospitais.

Que venham mais filmes tocantinenses, mais Manoel Medeiros e títulos de André Nascimento (que já assinou o longa coletivo Palmas, eu gosto de tu, em 2014).

A produção e distribuição de O comedy club é da SuperOito Produções, de Tocantins.

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