O Portal do Paraíso
O emblemático filme-problema de Michael Cimino chega em home-video, que ajuda a entender seus bastidores.
Por Osvaldo Neto | 09.12.2016 (sexta-feira)
Em novembro de 2014, a Obras-Primas do Cinema (OP) chega ao mercado brasileiro. Com uma média de três a quatro títulos por mês, a empresa tem lançado uma série de filmes que nunca receberam a devida atenção no nosso País. Vários dos títulos presentes em seu catálogo só tiveram o seu primeiro lançamento em DVD através desta distribuidora.
E um dos seus últimos lançamentos é a edição especial com dois DVDs pela primeira vez no Brasil de O Portal do paraíso, do realizador Michael Cimino, falecido neste ano de 2016 aos 77 anos. Assim como Profissão: Ladrão, Peggy Sue – Seu passado a espera e Mamãezinha querida, outros longas também lançados pela OP neste ano, esse trabalho de Cimino é um daqueles casos onde estamos diante de uma obra que é mais comentada do que assistida.
O DVD utiliza como matriz a versão restaurada e re-editada pelo seu diretor com 216 minutos de duração. Foi um trabalho cauteloso, ‘frame a frame’, onde Cimino alterou radicalmente como a fotografia do lançamento original era vista e conseguiu deixar o filme e o trabalho de Vilmos Zsigmond ainda mais lindo de se ver. Depois da fria recepção inicial, a United Artists ainda lançou uma versão de 149 minutos e foi um catastrófico fracasso de bilheteria do mesmo jeito. O fiasco de público e crítica desse filme foi decisivo na venda da UA para a MGM e no fim do reinado dos diretores da New Hollywood (exceto nomes que continuavam lucrativos como Steven Spielberg, George Lucas e Woody Allen) com os estúdios junto a O fundo do coração de Francis Ford Coppola.
Dizer que a produção deste faroeste épico foi problemática é de uma gentileza sem tamanho. As histórias por trás dos bastidores chegam a ser tão extremas que beiram o insano. O perfeccionismo exagerado de Cimino, saído de uma grande vitória no Oscar por O Franco-Atirador, que chegou a esperar horas para que o céu ficasse do jeito que ele queria para filmar algumas sequências, a gastar dias com cenas que não duravam pouquíssimos minutos e a demolir sets inteiros por pura birra e insatisfação.
A produção dividiu opiniões até mesmo nos seus bastidores. Enquanto Kris Kristofferson, Isabelle Huppert, Jeff Bridges e Christopher Walken manifestam orgulho com relação a esse filme, Tom Noonan e Terry O Quinn (dois character actors de responsa) odiaram trabalhar com Cimino. O diretor chegou a demitir um então estreante Willem Dafoe porque o ator gargalhou de uma piada contada por um figurante. Dafoe continua no filme em uma participação não-creditada no melhor estilo piscou, perdeu durante uma briga de galos. John Hurt, então um dos atores principais do filme, ficou fulo e impaciente com o longo ritmo das filmagens e chegou a rodar O Homem elefante” inteiro enquanto o seu personagem em O Portal do paraíso precisou ter cenas cortadas e reescritas do roteiro. Não é para menos que ele está desperdiçado pois o seu Billy Irvine decepciona ao aparentar tamanha importância para a história de James Averill (Kristofferson) e terminar sendo pouco mais do que uma ponta de luxo.
Por essas e outras, o orçamento do filme pulasse de 11 para 40 milhões de dólares, tido como um dos maiores do período. Hoje esse valor corrigido não paga metade de um filme do Transformers. Para saber de mais histórias lendárias a respeito da produção, recomenda-se a leitura do obrigatório Easy Riders, Raging Bulls, de Peter Biskind e de Final Cut: Dreams and Disaster in the Making of Heaven’s Gate, escrito por Steven Bach, que foi executivo da United Artists no período da produção deste filme que, sim, tem seus admiradores e detratores e pode ter pecado pelo excesso e ambição de Cimino mas cá entre nós… qual o ser humano que nunca pecou em sua vida por esses dois belos motivos?
A chegada do lançamento do DVD duplo da Obras-Primas do Cinema no nosso mercado é uma oportunidade para o espectador do nosso país conhecer esse importante trabalho de um dos maiores diretores do cinema norte-americano. Além da cópia restaurada do longa, o segundo disco apresenta depoimentos de Michael Cimino e Joann Carelli (produtora), Kris Kristofferson, David Mansfield (o jovem compositor da belíssima trilha sonora que também aparece no longa como um violinista) e Michael Stevenson (segundo assistente de direção, que já tinha trabalhado com ninguém menos que David Lean e Stanley Kubrick), mais uma demonstração do trabalho de restauro da produção, um teaser e um spot de TV. O verso da capa do DVD apresenta um still com Kristofferson e Huppert e, como sempre, o produto vem acompanhado de um card colecionável. Essa edição especial de O Portal do paraíso pode ser encontrada facilmente nas melhores lojas físicas e online.
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