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Críticas

Scoop – O Grande Furo

A carta marcada de Allen

Por Luiz Joaquim | 13.08.2018 (segunda-feira)

-publicado originalmente em 16 de março de 2007 no jornal Folha de Pernambuco

O diretor Woody Allen interpreta um personagem no novo filme que ele mesmo dirige, Scoop – O Grande Furo (Scoop, EUA/Ing., 2006); e, pela primeira vez, isto não é bom. É claro que se o conhecido baixinho neurótico não estivesse em cena, o espírito seria outro. Não seria necessariamente ruim, pois basta lembra do anterior e aclamado “Ponto Final – Match Point” (2005). A questão aqui é a seguinte: em Scoop Allen parece atuar num descompasso em que estão os outros atores, afinados – Hugh Jackman  e Scarlett Johansson (sua nova musa).

Seu personagem aqui, o mágico Sidney, apresenta os mesmo trejeitos que todos os outros personagens que escreveu para ele mesmo atuar. Em alguns casos, que escreveu para outros atuarem como Kenneth Branagh em Celebridades (1998) ou Jason Biggs em Igual a Tudo na Vida (2003). É o caso de pensar se não chegou a hora, em benefício de seus próprios filmes, de o ator Allen descansar em dar espaço apenas ao diretor e roteirista Allen.

É duro fazer esta pergunta, uma vez que a simples imagem do franzino cineasta tentando dirigir um carro na Inglaterra, onde “tudo está do lado contrário”, já é suficiente para que seu habitual espectador (como este que escreve) abrir um sorriso de cumplicidade.

Também não é bom constatar que Scoop está bem abaixo daquilo que Allen conseguiu no predecessor Ponto Final: um roteiro preciso na dramaticidade, uma situação eticamente conflitante e uma ambientação impecável. De igual em Scoop temos apenas a mesma bela Johansson no elenco, e a velha Londres como cenário. Allen tem alcançado mais facilidade de filmar no Velho Continente que na América – seu projeto para 2008 será rodado na Espanha.  

Johasson – “um orgulho para a raça” – vive agora uma americana, estudante de jornalismo que está na Inglaterra e, ao participar como voluntária no espetáculo do mágico Sidney, encontra o espírito de um famoso jornalista londrino recém-falecido (Ian McShane). Ele lhe repassa um furo mas ela terá de buscar as provas que irão incriminar o aristocrata Peter (Jackman).

O desenrolar do enredo, e das piadas, fica por conta do cético mágico que, a contragosto, ajuda o “orgulho da raça” a provar a teoria soprada pelo fantasma, e daí virar um grande repórter com o seu furo.

Estrutura semelhante, só que melhor desenvolvida, Allen já criou em Um Misterioso Assassinto em Manhattan (1993) quando Diane Keaton insistia em querer provar que o vizinho era um assassino, para o desespero de seu marido Allen. O ponto de partida de Scoop – a mágica que dá errado – também já foi melhor aproveitado no curta Édipo Arrasado (episódio de Contos de Nova York, 1989), quando a mãe de Allen some da caixa do mágico para surgir nos céus da Big Apple.

Costuma-se dizer que Allen não se repete, se reinventa. Mas em Scoop fica difícil defendê-lo uma vez que as piadas parecem puídas, talvez porque não haja exatamente aquela camada de dubiedade moral no roteiro, tão comum em suas obras, dando um grau mais refinado e um outro sentido à graça que o baixinho faz de forma tão sagaz. Vamos torcer para que seu próximo filme – Cassandra’s Dream – no qual ele não atua, venha mais afiado.

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