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Festivais

12º Festival de Tiradentes – 2009 (Encerramento)

A polícia além da farda

Por Luiz Joaquim | 02.02.2009 (segunda-feira)

TIRADENTES (MG) – Ninguém duvidava que a sessão das 22h na sexta-feira passada da 12ª Mostra de Cinema de Tiradentes seria uma das mais concorridas de todo o evento. Isso porque a programação do horário oferecia a primeira exibição no mundo de “No Meu Lugar”, primeiro longa-metragem do respeitado crítico e realizador Eduardo Valente.

Um primeiro frisson geral em querer ver esse gigantesco (e inevitável) desafio ao qual Valente se lançou concentrava-se no fato do reconhecimento que o realizador arrebatou ao longo de uma década como uma das vozes mais pertinentes do país no exercício da avaliação cinematográfica. Num segundo momento, pelo respeito adquirido já com os primeiros passos como realizador com os filmes “O Sol Alaranjado” (2001), rodado em 16mm e vencedor da competição `Cinefondátion` em Cannes – de quem recebeu os prêmio das mãos de Scorsese – e depois, em 35mm, “Castanho” (2002) e “O Monstro” (2005).

O projeto de “No Meu Lugar”, co-desenvolvido por Valente e Felipe Bragança (parceiro da crítica na revista eletrônica Cinética e cujo primeiro longa, “A Vida da Mulher Macaco”, também exibiu por aqui), vinha sendo pensado há seis anos, e ganhou uma nova perspectiva a partir da repercussão de “Tropa de Elite”. Isso porque os três núcleos narrativo de “No Meu Lugar” tem como leitmotiv um erro numa abordagem policial, em referência ao passado, presente ou ao futuro dos personagens desses três núcleos dramáticos.

Em função da estrutura escolhida por Valente para contar sua história, montada em três instantes temporais diferentes e ligadas pelo eixo do erro policial, alguns colegas fizeram um ligação direta e perigosa com o tipo de cinema feito por Alejandro Iñarritu. Ligação simplória porque a estrutura no filme de Valente traz em si própria uma função narrativa que remete ao acaso, ou ao destino, como lembrou o crítico José Carlos Avellar em debate na tarde de sábado.

Nas três estruturas dramáticas independente temos o tenente da polícia militar afastado (o ótimo Márcio Vito) das ruas com sua filha; a viúva (Dedina Bernardelli) com seu novo companheiro e o casal de filhos do relacionamento anterior; e um entregador de água mineral (Raphael Sil) que vive numa favela com sua mãe e irmã, e que namora uma empregada doméstica da classe-média alta carioca. Nas três histórias, como segredou Bragança, há um cansaço, em todos eles, gerado por um desejo de querer sair daquele lugar existêncial mas não conseguirem.

Na verdade, enxergamos que a perda, e como lidar com ela, em função da constante presença da morte na vida dos personagens, seria a corda mais forte que ligaria os protagonistas dos três núcleos. Nesse sentido, Valente desenhou para o seu PM o retrato mais humano (humano, não herói) já empregado para um profissional assim no cinema nacional.

E essa intenção já pode ser conferida na abertura do filme, com os olhos de Márcio Vito em primeiríssimo plano, para depois dar lugar ao seu rosto, e depois o vermos sustentando uma arma numa viatura circulando pelo Rio de Janeiro. Ou seja, somos apresentados ao personagens sem nenhuma idéia de pre-conceito, para só depois o lermos como um policial.

Pelo histórico de Valente com o Festival de Cannes, “No Meu Lugar” deve ter lugar garantido na mais prestigioso festival de cinema do mundo. Isso significa que em maio vamos ouvir falar muito do que foi apresentado há pouco em Tiradentes.

Premiados na 12º Mostra de Cinema em Tiradentes

Antes da sessão mais esperada da sexta-feira, a Mostra ofereceu o primeiro longa em ficção do documentarista Vinícius Reis. “Praça Saens Peña”, que remete a uma localização da Tijuca, bairro tradicional do Rio de Janeiro, agradou público e crítica por abordar de forma limpa, objetiva e eficaz uma problemática comum à classe-média brasileira, foco que parece ganhar cada vez mais adéptos da nova leva de filmes brasileiros (vide “A Casa de Alice”, “Linha de Passe” e o próprio “No Meu Lugar”).

Em debate na tarde de sábado, o ator Chico Diaz destacou bem a força do filme, “fala de problemas de nossa vida cotidiana que aparentemente nem damos conta como um grande problema, mas que no fundo elas vão se acumulando e tornam-se insuportáveis”.

Ele se remetia ao drama silencioso e invisível que ronda a família de seu personagem, Paulo Barbosa, um professor secundarista que em 2003 ganha a chance de escrever um livro sobre a praça que dá título ao filme. Durante o processo, Paulo entra em contato com uma outra realidade social de seu bairro ao mesmo tempo em que perde da vista sentimental a esposa (Maria Padilha) e a filha adolescentes, também sua aluna, prestes a fazer o vestibular.

A disfunção familiar vai crescendo a medida em que o livro vai tomando corpo, e as soluções dadas por Vinícius são bem eficazes, incluindo um momento documental com Diaz entrevistando Aldir Blanc, espécie de figura símbolo daquela localidade.

PRÊMIOS
A 12ª Mostra de Tiradentes encerrou na noite de sábado anunciando a premiação concedida pelo júri oficial e popular. O melhor curta digital popular foi “No Tempo de Miltinho”, de André Weller. O melhor curta 35mm popular ficou com “Dossiê Rê Bordosa”, de César Cabral. Já “A Vida da Mulher Gorila”, de Felipe Bragança ficou com o título de melhor longa da mostra Aurora eleito pelo júri joven (selecionados por um curso de crítica realizado na edição anteriore do CineBH), assim como também foi o escolhido pelo júri oficial. Já o público contemplou “Titãs – A Vida até Parece uma Festa”, de Branco Mello e Oscar Rodrigues Alves pela mesma categoria.

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