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Críticas

Suburbicon: Bem-vindos ao paraíso

O mau cheiro do “sonho americano”

Por Luiz Joaquim | 26.12.2017 (terça-feira)

A melhor síntese para Suburbicon: Bem-vindos ao paraíso (Suburbicon, EUA, 2017), em cartaz no Brasil desde quinta-feira (21), está já nos créditos de sua abertura. Ela apresenta a publicidade de uma bairro norte-americano planejado, nos anos 1950, que de tão exitoso ganhou uma vida social própria, pela qual seus moradores, todos brancos e de classe média alta, poderiam viver sob a égide da ordem e do bem-estar coletivo; sem nenhuma interferência do que lhes fosse diferente. Até que uma família negra – os Mayers – passa a habitar uma casa em Suburbicon, desequilibrando a paz de racistas.

Na abertura do filme, as pinturas da publicidade, com seu cenário e personagens, transformam-se em lugares reais, com pessoas de carne e osso. O que temos daí por diante na história é a superfície de uma sociedade de aparências. E é disso que trata Bem-vindos ao paraíso. Dirigido por George Clooney (seu sexto filme nesta função), a obra tem roteiro co-assinado pelo galã hollywoodiano ao lado dos Irmãos Joel e Ethan Coen, além de Grant Heslov.

Mas essa nem seria uma informação importante se o espectador tiver alguma familiaridade com o cinema dos Coen. Muito rapidamente percebe-se aqui a atmosfera ‘Coeniana’, se assim podemos chamá-la, sendo a mais forte delas a crítica à sociedade ou, sendo mais preciso, contra burrice do pensamento raso e unidimensional de uma sociedade.

No caso, o ódio inexplicável dos moradores de Suburbicon contra os Mayers aparece como um pano de fundo. Mas, ainda que esteja presente como um papel de parede dramático, é por ele que a hipocrisia ganha mais relevância na historinha que o filme nos faz acompanhar.

A historinha nos mostra que os vizinhos dos Mayers, a família Lodge, são vítimas de uma invasão domiciliar seguida por um assassinato. E nunca na história de Suburbicon algo assim havia acontecido ali.

 

A história progride e enquanto a comunidade segue pondo na conta dos Mayers, ainda que de forma velada, o desequilíbrio que se abateu sobre o bairro, Clooney vai revelando aos poucos a verdadeira face de Gardner Lodge (Matt Damon), e de sua cunhada Margaret (Julianne Moore, que também interpreta a gêmea de Margaret/esposa de Gardner).

Num crescente de equívocos, em que Gardner só compromete cada vez mais seu status social e sua ideia de normalidade e controle – seus óculos remendados é uma ótima alegoria a isto -, Bem-vindos ao paraíso nos coloca ao lado da maior vítima desse imbróglio que vem a ser o filho de Gardner, o garoto Nicky (Noah Jupe, também em cartaz no filme Extraordinário).

Equilibrando-se entre a construção de um suspense clássico (com uma trilha-sonora pobre do engabelador Alexandre Desplat) e uma crítica social condimentada com pitadas de ironia e sacarmos (vide a fuga de Gardner numa bicicleta infantil, ou o sorriso falso de Margaret enquanto serve café para um chantagista – Oscar Isaac, o Poe Demeron de Star Wars: Os últimos Jedi), Suburbicon soa como um projeto menor (mas não menos interessante) dos Coen.

E, certamente, o que diminua o projeto talvez seja a direção de Clooney. O curioso é que Suburbicon não é um subproduto. Deve ser lembrado no futuro como um bom espelho hollywoodiano sobre a sociedade que a criou. O entrave talvez esteja numa sombra: o histórico dos Coen, que já nos deram (e continuam dando) verdadeiras obras-primas cinematográficas sobre a o lado obscuro do ser-humano. Sempre nos fazendo rir ao mesmo tempo que nos espantamos com ele. Assim como Clooney se esforçou para fazer aqui no seu Suburbicon.

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