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Festivais

13º Cine Ceará (2003) – debate com Orlando Senna

Orlando Senna: Quem tem que fazer contrapartida social é o governo e não o artista.

Por Luiz Joaquim | 12.05.2020 (terça-feira)

– texto originalmente publicado no Jornal do Commercio (Recife), em 13 de maio de 2003 (terça-feira). Na foto, o então secretários do audiovisual, Orlando Senna (em foto da 20ª edição do festival, ano 2010, crédito da foto Aline Arruda).

FORTALEZA (CE) – Na tarde do último domingo, o apinhado salão Castello, do Hotel Ponta Mar (onde está concentrado o elenco do 13º Cine Ceará), transformou-se numa arena na qual o gladiador do Governo Federal era o secretário do Audiovisual, Orlando Senna. As feras estavam na pele de dezenas de cineastas simpatizantes do manifesto divulgado na quinta-feira, com assinatura de 50 nomes de peso (hoje, mais de 70) do meio cinematográfico solicitando nitidez e representatividade no diálogo entre Governo e classe artística.

Senna abriu a conversa relembrando que a linha mestra do Ministério da Cultura para os próximos quatro anos é mostrar cinema a todos os brasileiros. Para conseguir isso, anunciou três propostas: que os ingressos às produções culturais estejam, de fato, compatíveis ao bolso do povo; que sejam criados centros culturais mais democráticos (contemplando trabalhos populares); e que haja reformatação na rede pública de TV brasileira, unindo as TV universitárias e as comunitárias que, segundo o secretário, formam mais de 1.000 pontos juntas. “Não significa que o mercado produtor será esquecido. Trabalhamos na instalação da Agência Nacional do Cinema (Ancine) como um órgão fiscalizador e reparador”, esclareceu.

Um dia antes dessa discussão, o Senador Saturnino Braga, também aqui no Ceará, sugeriu que ainda não era ponto pacífico que a administração dos recursos incentivados ficasse ao cargo da Ancine. Mas Senna refutou esse argumento e disse que o manifesto dos 50 cineastas foi lido pelo ministro Gilberto Gil, e que sua secretaria está aberta para matizar os acordos com a classe cinematográfica. “Não me parece que o artista pode oferecer contrapartida social. Há uma inadequação aí, uma vez que o artista é produtor e não exibidor. Quem tem que fazer contrapartida social é o Governo e não o artista”, diz Senna.

POLÊMICA – A presidente do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC, que representa 42 entidades nacionais), Assunção Hernandez, levantou que as bandeiras da instituição que dirige estão em consonância com a plataforma do novo governo. “O que falta é clareza no encaminhamento dos diálogos”, reclamou.  “Quanto vale isoladamente o voto de um Cacá Diegues e quanto vale o voto de um CBC ou de uma Associação Brasileira de Documentaristas num pleito com o Governo? ”  O discurso de Hernandez foi apimentado com o temperamento do cineasta Cláudio Assis quando, de pé, esbravejou irado que “o CBC não pode ser enfraquecido. Cacá Diegues e Paulo Thiago são dois caras que sempre mamaram e não representam o cinema nacional”.

Senna explicou que, semana passada, o Governo simplesmente atendeu a um pedido de um grupo de personalidades que tem o direto de se expressar. “Quando o Claudio Assis se diz injustiçado, isso é uma opinião pessoal e eu, como um funcionário público, tenho de ouvir a ele também, mas não há duvida que nossa preferência é dialogar com um órgão que represente oficialmente a classe. O setor precisa se organizar e nós não queremos e nem podemos interferir nisso”, esclareceu Senna.

Assunção Hernandez, aproveitou a autoridade do secretário do Audiovisual, para apontar uma reunião com o CBC, na próxima semana, e firmar um primeiro pacto com o novo Governo. O diretor do Cine Ceará, Wolney Oliveira, sugeriu que todos as decisões fossem tomadas em Brasília, “assim ganham um tom oficial e evitam mal-entendidos”.

DESCENTRALIZAÇÃO – Outro ponto do debate, que durou cerca de três horas, foi a regionalização no repasse de incentivos fiscais. O site do MinC, mostra que, entre 1996 e 2002, R$ 3,3 bilhões em captações foram autorizados pela lei Rouanet e do Audiovisual. O eixo Rio-SP, Minas Gerais e Espírito Santo ficaram com 2,1 bilhões desse montante, enquanto as regiões Norte e Nordeste, somadas, não alcançaram 726 milhões.

Wolney Oliveira lembrou que a política do Cinema Brasileiro é feita num tripé formado pelo MinC, pela Ancine e pelo Conselho Superior de Cinema. Nesse último, representado por cinco nomes, quatro são do Rio do Janeiro e um de São Paulo. Wolney defende que cada cargo seja ocupado por um representante de cada região do País. “Isso tem de ser uma democracia”, finalizou.

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