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Críticas

Tropa de Elite

Polêmica, agora nos cinemas

Por Luiz Joaquim | 12.10.2007 (sexta-feira)

Ganha mais força hoje, agora através das telas de cinema, uma polêmica sócio-cultural que deverá durar meses, anos talvez. O fenômeno “Tropa de Elite” (Brasil, 2007), de José Padilha, entra em cartaz depois de ter sido visto por milhares (milhões?) de pessoas em DVDs piratas e em versões flutuantes na internet, tornando-se a produção nacional mais procurada no mercado ilegal.

O filme chegou lá através de um “vazamento” durante o trabalho de legendagem para o exterior. Houve quem acusasse Padilha de ele próprio ter tornado o filme acessível aos camelôs para promover o efeito mais eficaz no mercado cinematográfico: o boca-a-boca. A acusação foi refutada com veemência por Padilha em artigo aberto, publicado num jornal carioca, no qual avisava também que a versão oficial, mostrada ao público pela primeira vez no último dia 20, no Festival do Rio, chegaria diferente daquela veiculada há semanas no mercado negro.

Só por isso, “Tropa de Elite” já teria seu lugar garantido na história. Mas tem mais. E são questões complexas de resolver, pois ultrapassam aspectos do direito autoral, na qual o conceito de certo e errado já estão consagrados na legislação. A questão em destaque, mais concentrada na figura do personagem Capitão Nascimento (magistralmente interpretado por Wagner Moura) atinge a esfera da ética e da moral, ou seja, são campos de eterno conflito e que rendem, num nível filosófico, discussões sem fim.

A ficção de Padilha foi adaptada do livro “Elite de Tropa”, de Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), em parceria com o sociólogo Luís Eduardo Soares. O enredo nos é contado pelo voz onisciente do Capitão Nascimento. É ele que comanda as operações da companhia de elite, que entra em ação em todas as 700 favelas do Rio de Janeiro quando a polícia não consegue resolver as guerras dali. Até aí tudo bem.

E tropa de elite continua mostrando as mazelas sociais de um sistema corrompido. Foca nos policiais do Rio de Janeiro e em toda uma sorte de esquemas e maracutáias que não são difíceis de acreditar para quem lê jornal e vê TV com os olhos aguçados, ou simplesmente caminha pelas ruas do País.

Ao som da canção que diz que a missão da Tropa ao subir o morro é “deixar corpo no chão”, vamos conhecendo o inflexível Nascimento em sua fúria contra a tráfico, contra a corrupção, e seu ódio visceral contra os usuários de drogas. “Quantas crianças ainda vão morrer para playboy enrolar baseado”, ele se pergunta.

Apesar de Padilha, em diversas entrevistas, insistir que a perspectiva do filme é a perspectiva de Nascimento – um homem que observa a podridão do sistema por dentro e ojeriza seus mecanismo desonestos -, não há como deixar de observar que “Tropa…” também usa mecanismos cinematográficos para fazer de Nascimento um herói. Pior, um sujeito que figura como a única forma de solucionar um problema monstruosamente mais complexo e maior do que a participação de playboys viciados e ONGs picaretas.

Também não há como negar a inquestionável qualidade narrativa do filme. Padilha fez uma obra eletrizante e por isso mesmo perigosa para mentes dormentes. Embalados pela lógica pequena do assassino Nascimento, podemos achar que ele está sendo correto, ou justo, quando na realidade, o que promove são execuções. Na realidade, pela competência de Padilha como articulador rítmico de imagens, podemos nos pegar vibrando durante a sessão no cinema, quando o Capitão dá um esculacho num viciado ou manda colocar um traficante na “conta do Papa”, ou ainda pega uma vassoura para torturar um garoto com as calças arriadas.

Não há purismo em querer, no cinema, um herói diferente de um vingador. Isso porque, é sabida a influência do filmes sobre quem os vê. E, definitivamente, Nascimento não é um bom exemplo. Principalmente para um País cuja maior parcela da população está suscetível a acreditar (por razões que já estamos cansados de saber) que justiça por aqui só mesmo com as próprias mãos.

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