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Entrevistas

Entrevista: Hilton Larceda, Marcelo Pedroso

Uma tatuagem e uma balsa na estrada

Por Luiz Joaquim | 04.02.2009 (quarta-feira)

A 12a. Mostra de Cinema de Tiradentes, que encerrou no sábado, levou vários pernambucanos à histórica cidade mineira. Foram exibidos noves filmes de Pernambuco, entre eles “KFZ-1348”, de Gabriel Mascaro e Marcelo Pedroso. Nas três horas da viagem de volta, no trajeto de micro-ônibus entre Tiradentes e o aeroporto de Confins, Minas Gerais, Pedroso veio ao lado de Hilton Lacerda, o roteirista de filmes como “Filmefobia”, “Baixio das Bestas”, “Árido Movie”, “O Baile Perfumado”, entre outros, e co-diretor (com Lírio Ferreira) de “Cartola – Música para Os Olhos”.

Propondo uma bricandeira séria, sugeriu que um entrevistasse o outro sobre seu proximo projeto na agulha. Com muita descontração e humor, Hilton falou sobre “Tatuagem”, longa que rodará no Recife sobre uma famoso bar local dos anos 1970, e Pedroso teceu comentários sobre a idéia do próximo curta-metragem, o documentário “A Balsa”, em processo de montagem. Acompanhe.

Sobre o longa-metragem “Tatuagem”

MARCELO PEDROSO – Lembrando de “Cartola – Música para Os Olhos” (documentário co-dirigido por Hilton e Lírio Ferreira), penso que o filme náo tem o sentido de racionalizar a narrativa. Você acha que “Tatuagem” vai trilhar por aí ou vai ser uma ficção mais tradicional?

HILTON LACERDA – A idéia é fazer do “Tatuagem” um filme totalmente comercial.

MP – (gargalhadas) Você tá de sacanagem?

HL – Existem poucas formas de se ficar rico (risos). Mas, falando sério, a idéia é fazer um filme popular, totalmente juvenil. Isso porque o filme vai ser inspirando em todo o vivêncial de um bar gay que existia no Recife. E a média de idade das pessoas que faziam parte da frequência do lugar era entre 16 e 17 anos. Então, era um mundo totalmente adolescente.

MP – Em plena ditadura.

HL – Sim, a única pessoa mais velha do grupo, que era uma espécie de mentor intelectual, era o dono do bar. Ele tem 29 anos, e foi pai aos 17. O filho dele tem 13 anos, que era a minha idade em 1978, quando a história se passa, mas a data nem será tão determinante. Uma das idéias do “Tatuagem” é ter durante todo a história um personagem fazendo um filme em Super-8. E o nome desse curta se chama “2010 – Filosofia e Ficção” (risos). Seria uma visão de futuro a partir daquela época. É como aqueles jovens projetam o futuro dalí. E essa visão vê tudo voltado para a filosofia e para a tecnologia. Sei lá… por exemplo, o sexo seria abolido, o ânus seria a representação da unidade humana (risos).

MP – Mas você vai trabalhar politicamente a história do sexo? Alguma ligação com um tipo de resistência? Ou será algo mais lúdico, do prazer, e puxando para o hedonismo?

HL – É… o que acontece é que a gente naquela época começou a enxergar uma espécie de contracultura retardada por aqui, bem distante do seu momento original no exterior. Mas nossa história tem um cunho político sim. Pô, na ditadura alguns resistiam com a arma e outros com o …. (risos)

ML – Com o corpo (risos), por assim dizer.

HL – É isso, exatamente.

ML – E essa coisa do cinema comercial, é mesmo sério?

HL – Não, é piada. Estamos em pré-produção. Eu estou com uma primeira versão do roteiro fechada, mas vou trabalhar ainda e você é convidado para colaborar também. Eu adoro não parar de escrever o roteiro. Mesmo já nas filmagens, eu ainda fico lá rasbiscando. É ridículo.

MP – Está (o roteiro) num primeiro tratamento?

HL – Não sigo essa maneira de dar vários tratamentos, simplesmente vou escrevendo e vou mudando detalhes ao longo do tempo. Em “O Baile Perfumado” demos oito tratamentos, mas não eram oito tratamentos como sabemos, mas oito “sentadas” (pra discutir) possibilidade de mudanças a adaptações.

MP – Onde ficava a boate? Em Olinda?

HL – Era onde hoje está o Complexo de Salgadinho. Na verdade o que tinha lá era mangue. Era uma lugar engraçado. Tinha uma especíe de cosmopolitismo. Na primeira frase do filme, num off, tem uma cara que fica chamando as pessoas para ir ao “Studio 54” da periferia (famosa e concorrida boate novaiorquina dos anos 1970), para o Moulin Rouge da pobreza (risos).

MP – Você conheceu o bar ou só ouviu falar? Eu não conhecia.

HL – O bar era bem conhecido. Foi fundado em 1978 e fechou em 1981, mas havia um movimento do pessoal do teatro, o Vivencial, que iniciou em 1972. E o bar tinha “Vivencial” no nome. Eles faziam um teatro extremamente radical, etc. Jomard (Muniz de Brito) tinha uma ligação com o ‘Vivencial’. No início do projeto de “Tatuagem” eu pensava em fazer um documentário sobre Jomard, chamado “O Homem da Ponte”. Ele seria o cara que teria feito a ligação para o mundo acadêmico da experiência do “Vivencia”’.

Sobre o curta-metragem “A Balsa”

Hilton Lacerda – Conta a idéia de “A Balsa”.

Marcelo Pedroso – Vou trabalhar com uma balsa, fazendo uma travesia, e também com uma ponte em construção. A idéia é fazer pensar esses dois tempos. O tempo numa travessia da balsa e o tempo numa travessia pela ponte. A ponte está sendo construída durante o filme. E aparecem as várias etapas da construção dessa ponte, o que é uma proeza de engenharia, muito potente.

HL – Tem de ver o grau de mudança que isso vai gerar ao acabar a balsa, e só usarem a ponte.

MP – Pois é, tem esses dois mundos em conflito. Uma vez concluída a ponte, a balsa tende a acabar, mas o perigo do filme e cair numa romantização da balsa, cair numa tendência em dizer que a balsa é melhor que a ponte e condenar o progresso. Isso é algo que quero evitar. Mas ainda tô montando. Também vou trabalhar uma espécie de torpor que as pessoas sentem ao entrar na balsa.

HL – Quando você gravou?

MP – Em agosto de 2008, inclusive trouxemos um fotógrafo do Ceará, Ivo Lopes Araújo, que também fotografou um novo filme de Marcelo Lordello sobre vigias norturnos. Foi quando conhecemos Ivo e começamos a trocar idéia com todo um pessoal do Ceará fazendo bom cinema lá. Vimos um filme de Ivo, o ôSábado à Noiteö, aí chamei ele para fazer ôA Balsaö e depois ele fez também o ôBrasília Formosaö, de (Gabriel) Mascaro. A gente tá construindo uma relação super-legal com a galera de lá.

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