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Festivais

14° Cine-PE (2010) – noite 3 (cobertura)

Para desbaratar um sequestro

Por Luiz Joaquim | 29.04.2010 (quinta-feira)

Ainda esta semana, a imprensa noticiou como o nosso vice-presidente da República, José Alencar, foi vítima de um golpe de falso seqüestro. Com seu peculiar humor, Alencar lembrou do episódio apesar de saber, como todos nós, da gravidade da questão. Na noite de terça-feira, o 14º Cine-PE: Festival do Audiovisual deu um presente sobre esse assunto. A exibição do longa-metragem de Wolney Atalla, “Sequestro”, pelo qual o cineasta acompanhou por quatro anos a divisão anti sequestro (DAS) da polícia de São Paulo.

Wolney, já experiente no festival recifense no qual exibiu seu primeiro longa em 2001, “A Vida em Cana”, voltou agora mais maduro desenhando já nos quatro minutos iniciais de “Sequestro” um painel da evolução do negócio em que se transformou esta ação criminosa. O realizador resgata como as táticas de treinamento para o sequestro político, treinadas em Cuba sob supervisão da antiga URSS, chegaram aos criminosos comuns do mundo inteiro, fazendo com que o índice de sequestros ordinários multiplicasse de apenas três no ano de 1986 em São Paulo, por exemplo, para mais de 300 em 2001, naquela mesma cidade.

A respeito desse ponto, há no filme um depoimento de Humberto Paz, preso em Itaquitinga (PE), um dos responsáveis pelo seqüestro do empresário Abílio Diniz em 1989, lembrado que a prática no passado tinha outra intenção. A fala de Paz provocou risos na platéia do Cine-PE pela tentativa de justificar algo injustificável, mesmo sendo a declaração coerente dentro daquele contexto.

Em ritmo de thriller, Wolney conta sua história acompanhando a investigação, por mais de 30 dias, do sequestrado José Ibiapina. Com a câmera dentro da casa dos familiares, vemos a negociação por telefone entre o filho da vítima e os bandidos sob coordenação da DAS. Entremeando esse processo, Wolney intercala depoimentos de ex-sequestrados contando seus momentos de terror e o que ficou daquela experiência.

Os momentos mais impactantes ficam por conta do momento em que a polícia põe um seqüestrador no lugar da vítima, e desmonta o cativeiro, efetivando resgates. A câmera de Wolney consegue, nesse momento, registrar sua maior preciosidade. O instante exato em que, para citar dois exemplos, encontra uma garota de seis anos, além do adolescente Anderson. A indescritível expressão que vemos do rosto de Anderson ao entender que está livre, após 28 dias isolados e no escuro, merece todo o respeito de Wolney como cineasta.

Não podia haver contraste maior na programação entre a seriedade de “Sequestro” e a problemática tentativa de exercício cinematográfico de Oswaldo Montenegro em seu primeiro longa “Leo & Bia”, exibido na sequencia. Adaptado de sua própria peça dos anos 1980, e todo gravado num galpão com parcos adereços (intencioalmente para ressaltar os atores), o enredo fala de sete jovens brasilienses no início dos anos 1970 dispostos a viver do teatro (“hã!”, responde uma auto-ironia do filme). Entre um ensaio e outro, um triangulo amoroso corre por fora, atrapalhado pela neurose da mãe (Françoise Forton) de uma das atrizes.

Há muito pouco cinema no filme de Montenegro. Com opções dramáticas próprias da linguagem teatral, o exagero das performances dói e as estratégias de encenação (a ditadura usando uma tesoura como óculos; sufoco emocional da personagem cresce com o aumento de cordas ao redor de seu pescoço) são funcionais num palco, não numa tela. A tela, historicamente, pede a sutileza, quase o sussurro, do ator para emocionar com mais competência quando o drama é interior ao personagem.

Antes dos longas foram exibidos os curtas “Revertere Ad Locum Tuum”, de Armando Mendz; “A Noite Por Testemunha”, de Bruno Torres; “Sobe, Sofia”, de André Mielnik;, e o sempre ótimo “Sweet Karolynne”, da paraibana Ana Bárbara.

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