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Críticas

Hoje eu Quero Voltar Sozinho

O primeiro beijo

Por Luiz Joaquim | 17.04.2014 (quinta-feira)

Com a estreia hoje, nos cinemas do Recife, dos filmes “Hoje eu Quero Voltar Sozinho” (Bra., 2014), de Daniel Ribeiro, “Copa de Elite”, de Vitor Brandt, e “Júlio Sumiu”, de Roberto Berliner, o espectador estará exposto a duas vertentes diamentralmente opostas da atual produção brasileira: a comédia e o romance juvenil. Somando-se aos outros nacionais em cartaz – o suspense “Confia em Mim”, de Michel Tikhormiroff, e a derrota “S.O.S. Mulheres ao Mar”, de Cris DAmato – terá-se a impressão (correta) que nosso cinema já alcançou, ainda que de forma cambaleante, um cenário interessante na diversidade de ofertas de gêneros cinematográficos.

Enquanto o beisteirol “Copa de Elite” aposta nas piadas fáceis, espelhando-se nos enlatados norte-americanos, o romance juvenil “Hoje eu Quero Voltar Sozinho” concentra-se em sua própria identidade, para contar uma história, como outra qualquer, sobre o primeiro beijo.

Há aqui, entretanto, um condimento. Ou melhor, dois. O primeiro diz respeito ao fato de que este primeiro longa-metragem de Ribeiro é uma extensão de seu curta-metragem “Eu Não Quero Voltar Sozinho” (2010 – leia crítica sobre o curta quando ele foi exibido pela primeira vez no Brasil – no link ao fim desse texto “3º Fest. de Paulínia – noite 4”), realizado com o mesmo trio de protagonistas que vemos no longa (Tess Amorim, Fabio Audi e Gulherme Lobo). Tal curta virou um fenômeno. Foi exibido em mais de 100 festivais entre nacionais e internacionais. Levou 82 prêmios. E quando foi disponibilizado na internet, recebeu mais de três milhões de visualizações.

O longa, ainda em início de carreira (estreou no Sudeste semana passada), também já chega coroado pelo prêmio da crítica internacional (Fipresci) recebido na mostra Panorama, no Festival de Berlim 2014; e também levou o Urso Teddy, para filmes com temática gay, conquistado no mesmo festival. E é aqui que reside o segundo condimento de “Hoje eu Quero Voltar Sozinho”.

À rigor a história do adolescente Leo (Lobo) é sobre o primeiro beijo, ou seja, um momento sagrado na vida de qualquer ser-humanos que respira oxigênio. A situação já foi viu vista num sem-fim de filmes juvenis, mas “Hoje eu Quero Voltar Sozinho” vem provocando um (bom) rebuliço particular no universo homossexual por mostrar sem floreios esse momento íntimo no casal formado pelos meninos Leo e Gabriel (Audi).

Assim como “Tatuagem”, de Hilton Lacerda, aspectos como conflitos homossexuais nem são mais “uma questão” aqui. O que preocupa o “boca-virgem” Leo é o fato dele ainda não ter beijado ninguém na boca. Leo ainda é um inocente, e ele parece cansado disso. Em seu universo de adolescente cego, superprotegido pela mãe (Lúcia Romano) em função de sua deficiência visual, o que lhe apoquenta é a falta de confiança de seus pais a ponto de lhe complicar uma ida a um acampamento colegial, ou levar adiante a ideia de um intercâmbio no exterior. Isso sim lhe incomoda. Não sua sexualidade. Tanto que ao contar sobre sua paixão por Gabriel a sua melhor amiga, Gio (Amorim), não há nenhum drama de sua parte, apenas o susto da amiga.

Nesse sentido, Ribeiro faz um belo filme. Na verdade, bastante coerente. A melhor demonstração desse coerência está nesse momento da revelação de Leo a Gio. Parte da surpresa dela ao saber que Leo está apaixonado por Gabriel reside nela acreditar que ninguém era mais importante para Leo do que ela própria. Mas parte da surpresa está no fato dele gostar de outro menino. A notícia, entretato, é dada sem drama por Leo, e recebido sem drama pelo espectador.

Isto acontece porque, até chegar a este momento, o diretor e roteirista Ribeiro elaborou e realizou (com a ajuda precisa do elenco) a construção de uma naturalidade nesta crescente paixão entre os dois garotos e, por ela, o espectador não conseguirá desvalidadar sua autencidade invocando a homossexualidade.

Ponto para Ribeiro e para “Hoje eu Quero Voltar Sozinho”. Mas, ainda assim, toda sua beleza não esconde um excesso de fofura que dá uma medida quase não-real e comprometedora ao filme. Com o drama funciando dentro de um universo muito restrito – uma classe média paulista com padrão de tensão nunca ultrapassando o limite da atmosfera políticamente correta – a potência nos conflitos aqui soam rasas. E se por um lado a beleza da primeira paixão de Leo acaricia o espectador que com ela se identifica, o mundo tão perfeito no qual ele vive destoa daquele que conhecemos aqui fora.

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