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Reportagens

Lembra daquela videolocadora?

SMS, no Recife, fecha as portas

Por Luiz Joaquim | 01.03.2015 (domingo)

Há cerca de duas semanas, uma jovem senhora se encontrava no número 312 da rua José Osório, bairro da Madalena, no Recife, e lá chorava. E, enquanto se debulhava em lágrimas, também implorava: “O senhor não pode fazer isto. Eu vinha pra cá criança trazida pelo meu pai. Hoje sou eu quem trago meu filho!”

Quem conta a história é Sérgio Silveira, proprietário do negócio no endereço acima. A SMS Videolocadora. Mas não por muito tempo.

Quem transitou na rua José Osório nas últimas três semanas já deve ter observado uma faixa que anuncia: “Megafeirão de encerramento”. Para quem ainda não entendeu, a tradicional videolocadora está encerrando suas atividades após 28 anos de serviços prestados aos interessados em cinema.

A informação de que mais uma videolocadora irá fechar já deixou de ser notícia há alguns anos, quando as tevês por assinatura começaram a se popularizar e também com os sistemas de filme por demanda ou aluguel virtual, como o Netflix.

Mas a SMS nunca foi “mais uma videolocadora” no cenário do Recife. E o fim de seu negócio aponta para um futuro que parece inevitável quando o assunto é a locação de DVD ou Blu-ray num estabelecimento físico.

“Acabou!”, gritou sonoramente Sérgio Silveira para a reportagem no começo da entrevista feita no espaço com 360 m2 de área útil e que já teve cadastrados cerca de 300 mil sócios.

“Como modelo de negócio, não é mais algo lucrativo. No nosso caso, em novembro do ano passado, pela primeira vez desde 11 de setembro de 1987 quando inauguramos, a SMS entrou no vermelho. E eu entrei em conflito. Afinal como é que ia me desvencilhar daquilo que me deu tudo na vida? Mas entendi que deveria fechar as portas, e é o que vamos fazer agora em março”, vaticinou.

Antes de entregar o espaço, que é alugado, aos proprietários, Sérgio está se desfazendo do acervo hoje já minguado de DVD e Blu-ray em poucas prateleiras que estão na loja à venda pelo preço, respectivamente, de R$ 4,98 e R$ 16,98 desde janeiro.

Há três meses não era assim. O estabelecimento era alimentado não só pelos lançamentos mas por óperas, balé, musicais, documentários e outros títulos difíceis de encontrar que já renderam à loja o título de 2o lugar num ranking nacional de melhor acervo do Brasil, por oito anos consecutivos.

Sérgio, que também foi presidente por aclamação da Associação Pernambucana de Videolocadoras (APVL), lembra que a inteligência para investir e inventar quando o assunto era seu negócio promoveu a longevidade e o sucesso do espaço, que já sofreu cinco reformas estruturais desde sua inauguração.

“Fomos a primeira no Brasil a funcionar 24 horas. Foi de 1990 a 2000. Era uma época em que não tínhamos um índice de violência como temos hoje. Foi um sucesso absoluto. As pessoas chegavam aqui no final da balada, às 6h da manhã para locar filmes. Cheguei a ter 25 funcionários, dos quais seis operavam na madrugada. Tínhamos cinco terminais de atendimento e todos eles tinham fila”, recorda.

Tanto sucesso levou o empresário a abrir um segundo endereço para a videolocadora. Foi na avenida Rosa e Silva entre 2002 e 2013. “Abrimos e fechamos no azul”, garante.

Houve uma outra época em que a SMS também funcionou em dois endereços. Foi logo no início, entre 1987 e 1990, quando Sérgio operava no atual espaço e numa minúscula casa onde tudo começou, na avenida Rui Barbosa, ali mesmo na Madalena.

“Dessa época recordo um acontecimento que foi um divisor de águas para meu negócio. Era sexta-feira da Semana Santa de 1988. Naquela época nenhum empreendimento abria nesse período. Eu decidi lavar a loja pela manhã até que parou um carro e, sem descer, o motorista deu um grito: Tá aberto? Eu respondi que se ele não se importasse de ser atendido comigo de bermuda e com o piso molhado eu faria a locação para ele”, diz.

“Daí em diante entendi que não era a gente que determinava o horário que as pessoas iam locar, elas é que escolhiam o horário. Foi quando deixei de fechar às 19h e passei a fechar às 23h no domingo. Fui xingado até de herege pela vizinha por trabalhar na Semana Santa”, lembra sorrindo.

E o que fazer com tantas lembranças? Sérgio adianta que vai mudar-se para Porto de Galinhas e pensa em escrever. “O sentimento é de dever cumprido. Quem sabe não abro um blog para contar esses casos?”, encerrou com um ar já saudoso.

RISCOS – “Investi errado”. É como Sérgio Silveira lembra da aventura em que se meteu em 1998, quando decidiu também distribuir DVDs. “Eu comprava muitas unidades e revendia para locadoras pequenas. Tive muitos inadimplentes. Nunca perdi tanto dinheiro na minha vida como naquela época”, revelou.

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