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Festivais

43. Mostra SP (2019) – “Teerã: Cidade do Amor”

Solidão para inglês ver

Por Ivonete Pinto | 07.11.2019 (quinta-feira)

Teerã: Cidade do amor (Tehran: City of Love, Irã/RU/Hol., 2018),  exibido na sessão internacional da 43ªMostra de São Paulo, emula um esquematismo de Jafar Parahi. Especialmente O círculo (2000), que passou  na 24ª edição da Mostra, onde a sociedade era exposta através de esquetes no que tinha de mais hipócrita. Temas à margem, proibidos no cinema iraniano (e pela sharia) como a prostituição,  em Panahi viravam uma denúncia um tanto espetaculosa para atingir plateias estrangeiras. Do mesmo modo, ao mostrar um personagem com interesses claramente homoafetivos, o filme de Ali Jaberansar mira o estrangeiro, os festivais internacionais, pois a censura não deixará esta produção ser lançada por lá. Portanto, o filme, a despeito da relevância do tema da solidão e da inclusão de um personagem LGBT (o ex- campeão de fisiculturismo) objetiva mesmo o público externo. E seria  um filme banal, ingênuo e déjà vu, não fosse ter sido rodado na República Islâmica do Irã, que vive desde 1979 sob um regime teocrático xiita.

Trata-se de uma co-produção com Reino Unido e Holanda, o diretor Ali Jaberansari vive no Canadá desde a adolescência, foi feito sem a liberação do Ministério da Cultura iraniano e não depende do público interno para nada. Teerã: Cidade do amor é ancorado  em uma personagem-base, que conecta todo o resto, a secretária de um consultório de dermatologia (Forough Ghajabagli). Gordinha (clichê para mulher encalhada), um tanto sem graça, resolve suas frustrações amorosas no sorvete. A moça cria falsos perfis no Facebook para atrair homens bonitos que conhece no consultório, sendo que seu  prazer está em marcar os encontros e apenas observar de longe os pretendentes.

Tendo a solidão como assunto central, o irônico título Teerã: Cidade do amor, na ânsia  de explorar a multiplicidade de segmentos da sociedade real, também mostra um cantor de velórios, taciturno e sem sorte, que igualmente transita à procura de um amor. Na tentativa de mudar de público, ele começa a cantar em festas e uma delas são as de casamento. Na verdade, são festas que intitulam de casamento para driblar a polícia de costumes, pois todas as festas que não as familiares são, por princípio, proibidas. Mais uma desculpa para denunciar o que acontece por baixo dos panos. A polícia dá uma batida e todos vão presos.

Há uma piada interna, talvez a única piscadela ao espectador iraniano, que é a cena onde a secretária volta para casa e encontra a mãe sentada no sofá da sala. A senhora usa uma touca de plástico na cabeça, embora não esteja em roupa de banho. No ambiente doméstico as mulheres não cobrem o cabelo, então, para não correr o risco de ser inverossímel, há recursos como este para, ao mesmo tempo, não infringir um interdito no cinema, que é o de não mostrar, não importa a situação, mulheres com os cabelos descobertos. Um tipo de humor que faz menção à grande criadora destas manobras criativas, que é a diretora feminista Tahmineh Milani. Mas diferente dela, que continua morando no Irã mesmo tendo sido presa inúmeras  vezes, o diretor  Ali Jaberansar precisa se descolar da ideia de conquistar o olhar estrangeiro antes do olhar de seus conterrâneos.

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