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Festivais

Roterdã – IFFR (2020) – Eduardo Serrano

Serrano: muitas vezes o montador é o “produtor no escuro”

Por Marcelo Ikeda | 27.01.2020 (segunda-feira)

– na foto acima, Eduardo Serrano em foto de Marcelo Ikeda

ROTERDÃ (HOL.) – Nessa edição do Festival de Roterdã não tivemos apenas a masterclass do fantástico Pedro Costa mas mais algumas outras, inclusive de um brasileiro, o montador Eduardo Serrano. Com seu jeito sereno, fala mansa e pausada, Serrano fez uma defesa aberta do cinema independente brasileiro. Falou dos contratempos políticos e das ameaças que estamos vivendo, mas sua defesa foi sobretudo da liberdade dos processos de criação. Entre os pontos colocados por Serrano, destaco os seguintes:

Serrano utilizou como método entrecortar sua fala com comentários de trechos de filmes montados por eles recentemente. Um fato chamou a atenção: Serrano selecionou exclusivamente filmes pernambucanos. Disse que, para o seu método de trabalho, é fundamental travar uma relação pessoal com o diretor (ou a diretora). Conversar com eles não apenas sobre questões diretamente ligadas ao filmes, mas sobre a vida e a morte, sobre suas angústias e desejos. É assim que consegue montar, buscando compreender as motivações do diretor. Disse que se orgulha de não ter um “estilo” como montador, mas que seu estilo é moldar-se segundo a necessidade de cada filme e de cada diretor. Por isso, alguns de seus filmes têm ritmos mais velozes e outros mais lentos. Que o diretor não é aquele que corta para tirar o que não serve, mas o que compreende o que é a essência de cada filme, e procura botar essa energia para dentro do filme. Com isso, Serrano escolheu filmes pernambucanos de estilos radicalmente diferentes. Começou com curtas, entre o entremeio de artes visuais e performance de Barbara Wagner e Benjamin de Burca e a animação íntima de Nara Normande.  Ou seja, não valorizou apenas os seus longas consagrados. E depois falou de Boi neon, Aquarius e Bacurau. Pelo tempo, ficamos com apenas cinco filmes, todos impressionantemente diferentes e extremamente bem-sucedidos.

Serrano abriu sua fala com um gesto muito bonito. Disse que se formou como montador em Londres e, ao final do curso, seu professor-tutor pediu que ele traçasse um plano com suas perspectivas de aplicação profissional. Para a surpresa de todos, Serrano disse que deixaria Londres ou a Europa, e voltaria para sua cidade natal, Recife, para tentar se engajar na cena de cinema independente que surgia por lá. Serrano disse que essa foi a melhor escolha de sua vida.

Foto: Marcelo Ikeda

Muitas coisas mais poderiam ser ditas. Serrano disse que muitas vezes o montador é “o produtor no escuro” (o escuro se refere à ambiência da ilha de edição), porque ali ele precisa encontrar as soluções possíveis para o filme, com os recursos que se têm disponíveis – e ele precisa dar uma resposta.

Sobre o trabalho com Kleber Mendonça Filho, Serrano disse que Aquarius é sobre a relação de KMF com sua mãe, que é preciso entender que a mãe de Kleber é uma historiadora, e por isso é tão importante para Kleber contextualizar historicamente seus filmes, que mostram ao final que a história é feita de ciclos que se repetem.

Disse que curiosamente Bacurau foi montado com um descompromisso. A crise era tamanha que eles pensavam que talvez esse seria o último filme que fariam. Por isso, esse filme teve uma liberdade maior que os anteriores – se esse pode ser nosso último filme, vamos procurar nos divertir. Foi o filme mais divertido que Serrano montou.

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