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Críticas

Criaturas do Senhor

Bom ver Emily Watson e Paul Mescal, mesmo num filme irregular.

Por Luiz Joaquim | 10.04.2023 (segunda-feira)

O talento de Paul Mescal ficou mundialmente conhecido pela sua indicação ao Oscar 2023 com a performance no ótimo Aftersun (2022) além, claro, da série fofinha Normal people (2020). Nesta quinta (13), o ator estará novamente em cartaz nos cinemas brasileiros em Criaturas do Senhor (God’s Creatures, Irl., RU., EUA, 2022), das diretoras Saela Davis e Anna Rose Holmer.

Mescal atua ao lado de ninguém menos que Emily Watson (Ondas do destino; Hilary e Jackie; As cinzas de Ângela; Embriagado de amor). Uma gigante do cinema inglês que há alguns anos tem recebido papeis secundários muito aquém do seu talento.

É nessa dupla no protagonismo em que parece residir o maior acerto das diretoras Davis e Holmer. Na verdade, Mescal talvez esteja assumindo aqui um primeiro papel de real risco se considerarmos sua iniciante carreira sempre na pele de personagens simpáticos (veja-o também no bom A filha perdida, 2021).

Em Criaturas do Senhor Mescal é também simpático, mas descobriremos que ele é um falso simpático. Como Brian, Mescal é o personagem que volta à pequena comunidade litorânea na Irlanda, sua terra natal.

Após uma fracassada experiência na Austrália, ele retorna para tentar resgatar uma esquecida fazenda aquática de ostras da família. Toda a comunidade local sobrevive em função da pesca, inclusive sua mãe Aileen (Watson), ocupando um cargo de supervisão numa empresa que trata pescados. É lá que Sarah (Aisling Franciosi), amiga de infância de Brian, também ganha a vida como uma das operárias.

Brian (Mescal), de volta à terra natal para tentar a vida numa fazenda de ostras.

Pautada pelo catolicismo (daí o título do filme), a pequena comunidade guarda histórias de horror em seus subterrâneos, como a violência doméstica (entre pais e filhos) ou contra a mulher. Violência comumente acobertada pelos próprios familiares.

A volta de Brian resgata um desconforto do passado, e reforça um atual envolvendo a sua mãe e a jovem amiga Sarah. É mais uma violência causado pela recorrente conduta machista de Brian, nunca corrigida, sempre empurrada para debaixo do tapete.

Sarah (Franciosi), mais uma vítima do machismo encoberto por uma comunidade

Mas a tensão de Criaturas do Senhor concentra-se, na verdade, sobre Aileen. Ela é a principal sabedora da criminosa nova ação do filho e sente-se dividida entre acobertar seu crime ou ser correta em denunciá-lo.

Dois pontos a partir deste contexto: (a) Emily Watson ganha aqui um personagem que lhe cabe como uma luva na medida em que suas grandes performances se sobressaíram a partir de figuras atormentadas. Nesse sentido, sua Aileen parece no ponto, com seus dilemas traduzidos de maneira comovente apenas com o movimento de seus olhos perdidos.

Watson (d) em mais uma performance sedutora, ao lado de Mescal (como Brian)

Já Mescal surge apenas cumprindo sua cota no modo ‘ok’. É provável que a dubiedade entre o ‘bom rapaz’ VS o ‘mau rapaz’ que reside naquele mesmo personagem precisasse ser melhor desenvolvida pelo roteiro (e por Mescal). O resultado é que a versão ‘bom moço’ dada pelo ator parece sobressair-se aqui, prejudicando inclusive o entendido do espectador para o desfecho desenhado pelo filme.

A opção final dada pela traumatizada mãe diante do problema que ela finalmente enxerga em seu Brian soa desproporcional àquilo que poderia ser corrigido ou punido de outra maneira. Uma pena.

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