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Críticas

Across The Universe

O anacronismo de uma psicodelia forjada

Por Luiz Joaquim | 28.03.2008 (sexta-feira)

“The Beatles” é um conjuntinho de dez letras que dava nome a uma banda inglesa responsável por frisson gigante há mais de 40 anos e ainda hoje perdurando (e perturbando) na cabeça não só de idosos, mas de jovens também. É preciso, entretanto, mais que um fio de enredo maltraçado interligando os sucessos dos quatros rapazes de Liverpool para compor um filme musical de força cinematograficamente equivalente ao talento musical do quarteto. “Across The Universe” (EUA, 2007) – em cartaz na Sessão de Arte do Grupo Severiano Ribeiro (Recife) – é exemplo disso.

Armada com os roteiros de Dick Clement e Ian la Fresnais, a diretora norte-americana Julie Taylor (de “Frida”) tentou aqui imprimir pela sua subjetiva ótica contemporânea do que é uma imagem ‘moderna’ (na falta de uma palavra melhor), a atmosfera psicodélica dos anos 1960. Época da revolução sexual no mundo, e, para os EUA, época da amargura na Guerra do Vietnã, sem falarmos na exacerbação das experiências narcóticas.

Nessa tentativa, Taylor se trai. Sem entrarmos na questão das limitações estilísticas do gênero ‘musical’ as quais “Across The Universe” se contenta pobremente em se encaixar, vemos sua pesada plástica visual brigando o tempo todo com as próprias canções reinterpretadas pelo elenco automático nas emoções que pretendem nos empurrar.

São como videoclipes estilosos (ou como papel de parede para PCs, como diz um colega), ferozmente atualizados com a tecnologia visual dos anos 2000, para melodias impregnadas na cabeça de no mínimo três gerações. Não seria espantoso, por exemplo, ver avô e neto numa sessão de um filme como esse. O mérito da sedução, entretanto é absolutamente pela garantia da presença na trilha sonora de canções como “I Want To Hold Your Hand”, “Let It Be”, “Something”, “Revolution”, “Hey Jude””All I Need Is Love”, “Lucy In The Sky with Diamonds”, “Strawberry Fields Forever” e outras 25 músicas distribuidas em longos 133 minutos.

O tal fio de enredo conectando os videoclipes do filme é o seguinte: anos 1960, jovem estivador (Jim Sturgess) de Londres vai em busca do pai desconhecido nos EUA, que engravidou sua mãe nos anos pós-2á guerra. O encontra numa universidade, mas fica amigo mesmo é de um playboy que desiste de estudar para ‘viver a vida’ em Greenwich Village, bairro boêmio novaiorquino. Apaixona-se também pela irmã do amigo (Evan Rachel Wood, de “Aos 13”) que é politicamente engajada, enquanto o estivador quer mesmo é ser um artista plástico. Poético? Poderia ser, mas em “Across the Universe” é apenas um clichê, assim como a aparição de Bono, ou como a entonação chata de Sturgess a la Ewan McGregor (sem o talento deste) em “Moulin Rouge!” (2001). Saudade do ótimo “Hair”, rodado em 1979 por Milos Forman e exibido gloriosamente em 70mm no saudoso Cine Veneza.

Dica: quer matar a saudade dos Beatles no cinema: em uma boa locadora, procure o documentário “Os Reis do Iê-iê-iê” (A Hard’s Day Night, 1964), de Richard Lester, ou “Yellow Submarine” (1968), de George Dunning.

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