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Festivais

Festival do Rio 2009 (7 out)

Em busca de sentidos para a existência

Por Luiz Joaquim | 08.10.2009 (quinta-feira)

RIO DE JANEIRO (RJ) – Foi possível identificar, coincidentemente, na programação desta quarta-feira do Festival do Rio (encerrado ontem), três filmes de nacionalidade bem distintas com um tema em comum: a desilusão pela vida numa atual geração de adultos e jovens. É um mal indefinido, responsável por uma profunda sensação de que a vida não tem sentido. Mal quase paralisante diante do tédio e da impotência diante desse tédio.

Sem dúvida, o mais redondo e tocante (e ao mesmo tempo acessível) filme entre eles foi “Corações em Conflito” (Mammoth, 2009), primeira produção internacional do sueco Lukas Moodyson, responsável pelos ótimos ‘Fucking Amal” (1998) e “Lilja 4-ever” (2002). O novo trabalho tem marcas próprias das producões contemporâneas. A história acontece nos EUA (NY), Tailândia e Filipinas ao mesmo tempo, com personagens interligados, e atores de diversas nacionalidades (Gael Garcia Bernal, Michelle Williams, Marife Necesito).

Por essa estrutura, houve quem o comparasse com o quebra-cabeça de Guillermo Arriaga, exibido um dia antes. É um equívoco, visto que “Corações…” é bem linear e concentrado num discurso melhor elaborado. Aqui, Gael é um gênio de jogos para computador que viaja para a Tailândia a fim de fechar um negócio de US$ 45 milhões. Williams, sua esposa, é uma médica que trabalha incessantemente numa emergência, e sente-se cada vez mais se distante de sua filha de sete anos (a encantadora Sophie Nyweid), enquanto a menina vai se afeiçoando fortemente à empregada filipina Glória (Necesito). Glória por sua vez deseja voltar a seu pais para cuidor dos filhos de dez e cinco anos vivendo lá com a avô.

Impressiona o talento de Moodysoon para transformar em bom cinema uma história tão simples por um comovente conto sobre a paradoxal e crescente desorientação das pessoas num mundo cada vez mais automatizado e interligado. Ao contrário do que se possa imaginar, não há desamor nesse conto que ele propõe (o roteiro é seu também), há apenas fadiga pela “falta de tempo” para contemplar e usufruir o que a vida pode oferece de bom. Isso independente da condição financeira. Os personagens também se comunicam, mas sofrem por uma cobrança desumana para a vida andar dentro da normalidade. É por essa cobrança que vem o sofrimento e a desorientação.

Entre as várias leituras possíveis abertas pelo filme, a da maternidade frustrada é a mais explícita. Tanto a mãe rica de Williams quanto a pobre de Necesito sofrem pela sua impotência e Moodysson calibra bem a repercussão do que isso significa para crianças pequenas. É tocante.

Um outro vazio é levantado em “Erotica Aventura” (À L’aventure, 2008). Na verdade, o diretor francês Jean-Claude Brisseau continua sua tara por desbravar os limites do sexo como fez em “Coisas Secretas” (2002) e “Anjos Exterminadores” (2006). Agora ele cola numa jovem economista (Carola Brana), que termina o noivado e pede demissão para repensar a vida, por sentir um vazio profundo consigo mesma. Ao conhecer um velho taxista que filosofa sobre a fragilidade da existência, se envolve amorosamente com um psicanalista que lhe introduz num projeto para expandir sua sexualidade.

A partir daí, Brisseau alterna aqui a busca pelo êxtase sexual e místico como opção para a não-razão de existirmo. É como se quisesse dar uma resposta ao fato de nós, humanos, sermos apenas “um acidente do universo”, como diz o taxista francês. O fato é que, como nos filmes anteriores, Brisseau alterna pieguiçe sexual com composições realmente bem estruturadas do ponto de vista do discurso. Um coisa é certa, goste ou não, seu cinema é sempre intrigante.

O mais fraco dos três filmes, mas não menos provocador, é o peruano “Deuses” (Dioses, 2008), de Josué Méndez. Estrutura-se numa família milionária formada pelo pai que se casa com uma mulher 20 anos mais jovens, enquanto o casal de filhos adolescentes de seu primeiro casamento vivem no hedonismo. Enquanto o pai só pensa num herdeiro sério para deixar seu legado, a filha rega sexo com drogas a cada festa que vai, ganhando uma gravidez sem saber quem é o pai. Diante do indesejado, seu plano é tomar ecstasy até matar o feto.

Já o irmão mais jovem tem a sexualidade reprimida por um forte desejo pela irmã. Sua madrasta, de origem humilde tendo casado por interesse, esforça-se para equiparar-se às esposas fúteis dos amigos de seu marido rico. “Deuses”, apesar de algumas limitações técnicas e interpretativas, é um retrato desolador a respeito das aparências e da incomunicabilidade das pessoas de hoje.

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