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Críticas

A Mente que Mente

A tragicomedia da perda da fama

Por Luiz Joaquim | 26.03.2010 (sexta-feira)

Assistir “A Mente que Mente”, horrível título brasileiro para “The Great Buck Howard” (EUA, 2008) – em cartaz no Cine Rosa e Silva -, é ser remetido imediatamente a duas questões. Uma é ficar diante da mediocridade, ou fragilidade (para ser mais delicado) pela qual pode se pautar uma vida seguida pela celebridade, pelo show business. Outra é a razoável independência da indústria cinematográfica norte-americana (ao contrário do cinema brasileiro) no que concerne a seu relacionamento com os programas de entretenimento na TV.

Do primeiro ponto. O grande Buck Howard é aqui vivido pelo ótimo John Malkovich. Ele é um mentalista, que evita ser chamado de mágico, pois se vende há 40 anos como autêntico ser especial capaz de ler e dominar a mente de sua platéia. A perspectiva que teremos do solitário e ranzinza Howard é a do jovem Troy (Colin Hanks, filho de Tom Hanks, que aqui é produtor e ainda faz uma ponta como o próprio pai de Troy).

Ainda na abertura de “A Mente que Mente”, sabemos que a opção de Troy em estudar Direito não foi uma opção, mas uma ordem de seu pai. Com dois anos de faculdade, decide lagar tudo para tentar fazer algo que o deixe feliz. Ele desconfia que esse algo seja ser escritor. Enquanto elabora isso, acaba por ir trabalhar como assistente de Howard para conseguir pagar as contas.

Viajando com o mentalista por escondidos municípios no interior dos EUA, Troy é, como nós, testemunha íntima de uma outrora estrela (Howard) em decadência expressa. Por esse aspecto, é bastante triste ver um homem que dedicou sua vida inteira ao show business ter de lidar com o fracasso. Parte dessa melancolia aparece em carne e osso na tela, pelos rostos principalmente de Michael Winslow (do filme “Loucademia de Polícia”) ou George Takei (o Sulu do “Jornada nas Estrelas” anos 1960).

A qualidade de “A Mente….” está particularmente em dar esse recado de forma divertida. A composição de Howard por Malkovich é hilária, como uma mentira que acredita em si mesmo. Com seus fricotes e estrelismo cheio de explosões de fúria, remete (extrapola, diríamos) ao igualmente nervoso personagem de Malkovich em “Queime Depois de Ler” (dirigido pelos irmãos Coen depois de ‘A Mente…’ já ter sido rodado).

Colin também tem uma boa presença em tela e está cercado por boa gente como Emily Blunt (também em cartaz com “O Lobisomem”), Steve Zahn, Griffin Dunne e o próprio Hanks pai em versão não bom garoto, o que remete às suas primeiras e divertidas comédias.

Do segundo ponto. Furioso por não ser chamado mais aos programas que ajudou, no passado, a virar um sucesso – como o “The Tonight Show”, da TV aberta norte-americana NBC -, Howard não alivia quando xinga Jay Leno, o atual apresentador ao ser relegado pela produção da TV. “Ele é o demônio. Eu não trabalho com o Demônio”. E ainda joga na cara, “sabe quantas vezes eu estive no programa com Johnny Carson? 61 vezes!”. Carson era o apresentador antes de Leno. Esteve a frente do show por 30 anos e era popularíssimo na América.

É de se admirar a despreocupação de “A Mente que Mente” com uma possível retaliação da TV gringa com o filme. Para nós, fica difícil imaginar um filme brasileiro sobre celebridades que diga o mesmo sobre Jô Soares, ou sobre sua produção, apenas para dar um exemplo que todos conhecem por aqui.

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