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Críticas

Meu Amigo Hindu

Dafoe é Babenco em filmes sobre a quase-morte

Por Luiz Joaquim | 02.03.2016 (quarta-feira)

Com “Meu Amigo Hindu” Babenco faz um resgate duro de seu próprio martírio que viveu no início dos anos 2000 em função de um câncer no sistema linfático. Para viver seu drama particular, convidou o ator Willem Dafoe que empresta a dignidade necessário para a dimensão da constante presença da morte.

Interpretando Xuxa Lopes, aquela que foi sua companheira durante seu tratamento, vemos Maria Fernanda Cândido. Já a composição da posterior esposa, que o encontra recuperado, vemos a própria personagem real, Bárbara Paz.

Falado em inglês, “Meu Amigo Hindu”, provocou reações diversas na crítica, quando exibido pela primeira vez no Brasil, na abertura da Mostra de SP (2015), que não conseguia desassociar o filme da personalidade do diretor que é conhecido por ser habitualmente áspero com a mídia. Há ainda outro complicador. A história contada está muito próxima do que já conhecíamos previamente pelas notícias a respeito do tratamento ao qual Babenco se submeteu.

A primeira informação que o espectador lê na tela é uma aspa do próprio Babenco sob um fundo preto: “Está é uma história que acontece comigo e a conto aqui da melhor forma que consigo”.

Isso dá um aspecto quase documental ao filme, exceto pelo fato de que há uma cuidadosa dramaturgia e elaborada misce-en-scène com detalhes do que possivelmente aconteceu (ou não) nos bastidores de seu tratamento; incluindo aí o relacionamento com sua companheira, entrando assim em outra esfera extremamente pessoal.

Mas, uma vez separado um assunto do outro, e vendo “Meu Amigo Hindu” pela perspectiva exclusiva de um olho limpo de pré concepções sobre a figura polemizadora que é de Babenco, enxergasse sim no filme uma beleza cinematográfico que consegue alternar entre a dor e o humor com sabedoria.

Na figura do cineasta Diego (Dafoe), Babenco não esconde sua própria rispidez com os irmãos, mãe, com a esposa e no mergulho que faz em si próprio ao se deparar com a morte (na figura de Selton Melo), além da alegria de uma nova amizade: o menino hindu em tratamento onde Diego faz o transplante de medula doado pelo irmão, num hospital em Washington.

Dafoe é figura essencial aqui, dando um tom de introspecção necessário ao filme. Tom que provavelmente não reconheceríamos com outro ator. Com trilha sonora (sempre) discreta do polonês Zibigniew Priesner, “Hindu” não deverá conquistar milhões como “Carandiru” (2003), mas pode acessar aquele espectador que se interessa pela experiência de quase-morte e suas conseqüências.

Há ainda a alegria do cinema como fonte de inspiração para a própria vida, com o diretor dando sua perspectiva para o jogo de xadrez com a morte, e a dança na chuva de Gene Kelly; aqui com Barbara Paz encarando uma cena já antológica e bela. Simples e bela.

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