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Festivais

49º Brasília (2016) – noite 6

Entre a memória e as máscaras dos relacionamentos humanos.

Por Luiz Joaquim | 26.09.2016 (segunda-feira)

BRASÍLIA (DF) – Na penúltima noite competitiva (25/09) deste 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro dois aspectos distintos amarraram os dois programas apresentados.

Abrindo a noite estavam os curtas Confidente, de Karen Akerman e Miguel Seabra Lopes, e Procura-se Irenice, de Marco Escrivão e Thiago B. Mendonça. Eles juntavam-se ao longa-metragem Vinte anos, de Alice de Andrade. Todos eles tendo como ponto de partida materiais de arquivo, ou como prefere o professor da UFF, João Luiz Vieira, “Filmes de Reapresentação”.

Em Confidente o que se vê é uma instigante exercício de reconexões de imagens frutos de um material original de 900 filmes distintos para aqui, nesse novo filme, estimular uma narrativa nova e livre das originais (narrativa esta não necessariamente definidora).

Em debate hoje (26) pela manhã, Miguel Seabra lembrou de seu interesse com Karen em experimentar os efeitos que a própria mente cria a partir das repetições de imagens. Coisa que Confidente cria numa meticulosa montagem, como que tentando esgarçar ao máximo a possibilidade dessa repetição sem que ela perca ou extrapole o limite do compreensivelmente aceitável.

Irenice também busca repensar o passado, na figura da atleta brasileira, negra, do título, que nos anos 1960 era rechaçada pela Ditadura Militar em função de sua constante voz contestadora contra o racismo. Para além do posicionamento político, o filme revela também o quão pioneira Irenice foi para o atletismo, particularmente na disputa dos 800 metros.

Em Vinte anos Alice de Andrade (filha do Joaquim Pedro de Andrade) revisita seu próprio material rodado no início dos 1990 para rever hoje, duas décadas depois, onde se encontram – tanto no sentido emocional quando social – três dos casais entre as dezenas que entrevistou no passado.

O filme busca um contraponto entre estes personagens humanos com as transformações político-sociais pela qual vem passando aquele país tão peculiar.

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Fotos de Júnior Aragão, divulgação – debate com equipes de “Irenice”; “Confidente” e “Vinte Anos”

RELAÇÕES VIRTUAIS – O bloco da programação seguinte agregou outros dois curtas – o maranhense Bodas de papel, de Breno Nina e Keyci Martins, e o paulista Demônia: Melodrama em 3 atos, de Caianan Baladez e Fernanda Chicolet – além do longa Malícia, de Jimi Figueiredo. O laço temático que os unia os dois últimos era o efeito de uma vida intermediada pela mídia virtual, tais quais redes sociais e derivados.

Bodas de Papel, traz um interesse mais particular. Ao mostrar num plano muito bem decupado, em que dramatiza uma tara sexual específica de um casal, abre portas para discussões sobre a representatividade masculina e feminina na sociedade.

Demônia, por sua vez, é um curioso exercício estético pelo qual constrói uma dramatização em esferas audiovisuais diferentes para cada um de seus atos. No primeiro (a cinematográfica) entra na sutileza dos personagens e em suas intimidades de forma mais humana e respeitosa. No segundo, apropria-se da linguagem da tevê e escangalha as relações dos personagens espetacularizando-os por esse meio. E no terceiro ato transforma o ato anterior num meme de internet, resumindo tudo a uma piada.

É interessante (e divertida) essa trajetória criada pelo enredo, mas traz também nela a certeza de uma hierarquia dos meios representados (cinema, tevê, internet) muito definidora para o bem e para o mal. Demônia, de qualquer forma, divertiu, e muito, o público brasiliense.

O longa de Jimi Figueiredo mistura uma situação familiar a partir de um dono de restaurante em Brasília que precisa pagar uma propina para evitar uma intimação criminosa em que se encontra seu negócio. Há uma crise familiar que permeia tanto a vítima quanto o algoz da propina que, ao mesmo tempo, tem também uma conexão com a esposa do dono do restaurante.

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Em foto de Júnior Aragão/divulgação, a atriz Marisol Ribeiro debate “Malícia”.

Truncado, em boa medida na sua narrativa, Malícia tem bons momentos, entretanto, promove outros dispensáveis ao todo. Dentro de um elenco que se encontra muito à vontade em seus personagens – entre eles Sérgio Sartório, Vivianne Pasmanter e a jovem Laura Teles Figueiredo (filha do diretor) -, o maior crédito deve ser entregue a Marisol Ribeiro, que tem um brilho próprio interpretando Camila.

Marisol surge aqui na categoria daquelas atrizes que transformam o que lhe é dado (mesmo que pouco) no máximo em termos do que a situação dramática pode oferecer de comoção humana.

Pela inteligência da atriz, que parece ter um controle quase matemático do que o seu rosto pode  oferecer (não no sentido mecânico da matemática, mas no da precisão), ela não ns deixa outra opção como espectador a não ser nos identificarmos com Camila, ou sofrer com ela, ou sofrer por ela.

Repetindo, seu nome é Marisol Ribeiro.

*Viagem a convite do festival

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