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Críticas

Árido Movie

O filho que a casa retorna

Por Luiz Joaquim | 09.09.2018 (domingo)

– publicado originalmente em 28 de abril de 2006 no jornal Folha de Pernambuco

O produto que resultou Árido movie (Brasil, 2006), primeiro longa-metragem de Lírio Ferreira após longos dez anos que o separa de O baile perfumado (co-dirigido com Paulo Caldas), exalta uma reunião de talentos criativos oriundos não só de Pernambuco mas também de fora do Estado. O filme levou seis títulos na edição do Cine-PE daquele ano e poderia ter levado mais algum, como o troféu para a direção de arte de Renata Pinheiro.

Mas se há algo a exaltar prioritariamente aqui, é a competência de Lírio Ferreira como diretor de cinema, auxiliado, claro, pela fotografia do veterano Murillo Salles. Salles andava afastado da cinematografia, função original pela qual ingressou na área, passando depois a se dedicar à direção, alcançando logo prestígio internacional. Por Nunca fomos tão felizes, seu primeiro filme, foi à Quinzena dos Realizadores, em Cannes 1984.

Havia uma curiosidade a respeito do que surgiria da união desses dois profissionais. De um lado, Ferreira com sua formação livre, amarras às raízes e referências em filmografias clássicas; do outro, Salles, dono de um cinema engajado que vinha flertando com o universo pop nos últimos trabalhos (vide Seja o que Deus quiser, 2003).

Nasce, então, Árido movie, espécie de registro sofisticado da história de Jonas (Guilherme Weber), um nordestino desterritorializado que volta a cidade natal, assim como tantos outros, e se depara com uma realidade distinta da qual a memória lhe guardava. Ele é um repórter do tempo de TV, vivendo no sudeste, que se vê obrigado a voltar a Rocha, município fictício de Pernambuco, para o sepultamento de Lázaro, seu pai (Paulo César Pereio) com quem não se relacionava desde a primeira idade. Lá, encontra um cenário que não mais reconhece, no qual é instigado pela avó a vingar a morte de Lázaro.

Num outro ramo da história, Bob (Selton Melo), Falcão (Gustavo Falcão) e Verinha (Mariana Lima) formam os amigos recifenses de Jonas que, inicialmente, o seguem até Rocha para lhe fazer companhia e terminam por viver uma história paralela, regada a sexo e muito entorpecente.

Uma terceira história – a da documentarista Soledad (Giula Gam) que quer registrar os mistérios que cercam Meu Velho (Zé Celso Martinez), um místico que diz dominar ‘as águas’ – se une a da família de Jonas, formada pelos meio-irmãos Salustiano (Matheus Nachtergaele) e Márcio Greyck (Aramis Trindad).

O roteiro de Árido movie, dividido por Ferreira, Sérgio Oliveira, Hilton Lacerda e Edu Nunes, passou por vários tratamentos e a amarração de todas as historias paralelas com o drama de Jonas salienta o cuidado e a preocupação do quarteto para que a fluidez entre a tensão de sua vingança, o envolvimento de Soledad e o humor de Bob, Falcão e Verinha se interligassem sem abrupções.

Mesmo assim, os últimos 15 e conclusivos minutos de Árido movie soam problemáticos, criando um falso clímax e gerando a sensação que muito se andou para chegar a lugar nenhum. Frases como “O olhar é a luz que sai do olho”, ou algo assim, sussurrada como algo revelador pelo Meu Velho, empobrece o legado que o filme quer deixar. O delicado aqui é que falhas encerrando qualquer obra tendem a minimizar toda a beleza que foi construída pelo seu corpo.

Ainda assim, Árido movie reascende a flecha que aponta para o cinema pernambucano, em particular para Ferreira, como vigoroso, inventivo e com personalidade, mesmo que hiperbólica.

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