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Críticas

Efeito Colateral

Arnold Schwarzenegger na busca por um herói frívolo

Por Luiz Joaquim | 27.09.2018 (quinta-feira)

– publicado originalmente no jornal Folha de Pernambuco em 08 de Fevereiro de 2002.

A pergunta é: o quanto a barbárie que marcou o 11 de setembro interfere na nossa leitura sobre um filme focando o terrorismo? Não deveria ser mas, ironicamente, essa é a mais forte questão que move nossa curiosidade sobre Efeito colateral (Collateral Damage, EUA, 2002) – a produção estrelada por Arnold Schwarzenegger. E o resultado é deprimente. Não pelo mérito de as tristes imagens das torres gêmeas desmoronando estarem sempre acessas na cabeça do mundo, e mais por conta de um roteiro fútil, recheado de valores falsamente moralistas que, por isso mesmo, resgatam a noção da hipocrisia numa cultura de patriotismo ensandecido.

Essa não é uma acusação forte. Está lá, em Efeito colateral, explicitada num específico diálogo entre mocinho e bandido, a verdadeira razão que move a violência: a própria violência. O filme é honesto nesse ponto, mas é também nocivo (assustador até) pela forma como se apresenta. Arnie faz Gordy, o protótipo do herói: ele é um bombeiro. A imagem inicial mostra o grandão salvando vítimas de um incêndio, para, logo depois, colocá-lo diante da tenebrosa cena na qual testemunha a esposa e o filho serem mortos numa explosão orquestrada por um terrorista colombiano.

Mesmo com a promessa do agente da CIA, Brandt (Elias Koteas) garantindo que o autor do atentado – o lider guerrilheiro ‘O lobo’ (Cliff Curtis) – será punido, Gordy decide partir para a América Latina por conta própria e exterminar, ele mesmo, o `mal`. Curioso é que o sentido de desforra pessoal não é maquiado. Vem claramente expresso no discurso do bombeiro viúvo. Mas sua decisão de vingar a morte da família começa a inquietar quando, para se justificar, começa a utilizar um palavreado alicerçado em argumentos patrióticos.

Outro problema surge quando, ao acompanharmos a pobre teia de circunstâncias criada pelos roteiristas David e Peter Griffiths e pela mecânica direção de Andrew Davis, temos de acreditar num civil que consegue chegar a um líder terrorista primeiro que toda a inteligência armada norte-americana. Pior: não há convicção expressa na tela para tanta determinação desprendida pelo bombeiro.

Curioso é que a nulidade de sentido na ação do personagem de Arnie resvala nos próprios diálogos. Quando o terrorista colombiano questiona ao americano o que lhes diferencia, uma vez que um quer matar por independência (dos EUA) e o outro quer matar por vingança, o bombeiro dá uma resposta que, de tão carregada de presunção, revela-se pavorosa para quem não for sobrinho do Tio Sam.

Falar da perspectiva deformada imposta por Hollywood sobre os personagens colombianos é chover no molhado. Aqui, descer correndo de um ônibus que cruza a fronteira entre o Panamá e a Colômbia, por exemplo, é motivo suficiente para ser metralhado, mesma que seja uma criança. Mas é divertido lembrar de determinados esforços do filme tentando dar um cunho realista à história. Como quando identifica, com largas legendas, supostas áreas perigosas na “maçã podre” do continente americano.

Duas boas surpresas do filme são o cínico canadense expatriado (John Turturro) trabalhando como mecânico para os guerrilheiros, e o supervisor de uma produção de cocaína, vivido por John Leguizamo (o Toulouse-Lautrec de Moulin Rouge!). Vale registrar que Leguizamo dá show a parte, quase que criando um filme dentro do filme com sua performance no universo que o cerca – observem Jesus, seu operário junkie.

Mas, a resposta para a pergunta no início do texto é que, independente da imagem viscosa do World Trade Center em chamas (e pelo que ela representa), Efeito Colateral não funciona. Colocações ideológicas a parte, o sentimentalismo exagerado do protagonista e o ritmo arrastado da narrativa contribui para sua deficiência como um produto que quer vender entretenimento pela ação.

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