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Festivais

12o. Tiradentes – 2009 (4a-feira)

Minas dá espaço a um cinema de sensações

Por Luiz Joaquim | 30.01.2009 (sexta-feira)

TIRADENTES (MG) – Mais duas estréias pernambucanas chamaram a atenção na noite de quarta-feira na 12ª Mostra de Cinema de Tiradentes. O curtametragem em 35mm “São”, de Pedro Severien, e o digital “Luz Industrial Mágica”, de Kleber Mendonça Filho. Este último compunha um bloco de outros trabalhos digitais com um viés daquilo que se convencionou chamar de `videoarte` ou `experimental`. A sensação foi reforçada ao constatarmos que o realizador mineiro Delanni Lima estava presente (como diretor ou montador) em metade dos oito títulos do programa.

Delanni é tachado por aqui como um dos mais respeitados `videoartistas` de Minas Gerais, e seu belo trabalho “Ko”, mostrado no bloco, corroborou para tal título. “Luz Industrial…” também estava posicionado entre obras de outros dois mineiros, Helvécio Marins Jr. (com “Nem Marcha Nem Chouta”) e o internacionalmente aclamado Cao Guimarães (“El Pintor Tira el Cine e la Basura”), o que reforçava ainda mais a sensação que o novo trabalho do pernambucano era um estudo visual (sem som) para refletir a partir da sugestão de sensações.

A participação de Kleber, Cao e Helvécio no programa foi defendida pela curadora Beth Miranda por o currículo do trio “alargar as fronteiras do vocabulário audiovisual”. Em “Luz Industrial…” Kleber aponta sua lente para o avalanche de jornalistas e frequentadores do Festival de Cannes, deslumbrados com os convidados do Festival e ávidos pelo registro de uma imagem, seja ela qual for, desses convidados. Com excessão do ator Eric Bana, “Luz Industrial…” não revela as estrelas que são motivos de febre.

Kleber está mais interessado no circo, ou ainda, como nos submetemos nos dias de hoje a esse circo. Os efeitos disso ainda é uma questão aberta que o filme não adentra, mas a perspectiva que o diretor nos dá, mostrando a cara de bobo de adultos felizes por terem conseguido um ângulo legal de sua celebridade, ou das dezenas de braços levantados para conseguir tal ângulo (fazendo com que as câmeras lá no alto funcionem como um terceiro olho) , nos lança a algumas questões do mundo moderno.

“Luz Industrial…” é um filme mudo, e editado todo em câmera lenta, em alguns instantes quase movimentado frame a frame, o que remete a mais uma ‘função’ ou qualidade do ávido registro audiovisual, que é o de congelar seu objeto (artistas ou não) e depois manipulá-los a nosso bel prazer. A informação, nos créditos finais, informando que Kleber fora o responsável pelo som do filme, que é mudo, fez a atenta platéia de Tiradentes gargalhar.

Apesar de estar num programa de filmes cuja a contemplação é a proposta mais explícita na linguagem, “Luz Industrial…” traz um dinâmica na edição que exalta a não-filiação original de seu diretor com esse, digamos, seguimento audiovisual. Em termos de acabamento, o filme de Guimarães, esse um craque no assunto, foi o outro com maior destaque do bloco.

À príncipio “El Pintor Tira el Cine e la Basura”, gravado na Espanha, remete imediatamente a uma vinheta, de fim dos anos 1980, na qual dois pintores entram num cinema para cobrir com tinta preta a projeção de “O Último Imperador” num cinema. Depois, sobre a tela preta, é traçada uma TV com giz, pela qual a imagem do filme de Bertolucci aparece diminuta, para depois dar espaço a mensagem “lugar de ver filmes é no cinema”. A vinheta, eventualmente, ainda é projetada no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco, Recife, antecedendo alguns longas.

A diferença entre a vinheta e o trabalho de Cao está no fato de que o pintor de “El Pintor…” trabalha para construir o ambiente cinematográfico, mas jogar, literalmente numa lixeira, o filme “Da Janela do meu Quarto”, ali projetado.

Curta de Pedro Severien estréia em Minas
Quarta-feira marcou também a última exibição dos curtas em 35mm. Entre eles o inédito “São”, de Pedro Severien, com a presença dos atores gaúchos Júlio Andrade (de “Cão sem Dono”) e Simone Spoladore (“Lavoura Arcaica”), e do pernambucano Germano Haiut.

Em debate na manhã de ontem, o curador Eduardo Valente lembrou que a narrativa de “São” não lhe permitia perceber em que instância temporal localizar as situações, se no presente, passado, em projeção futura ou mesmo num sentido de sonho. Severien ressaltou a perturbação psicológica de seu protagonista que, a nós, parece ser deflagada pela devastadora carta que seu pai morto lhe deixa: “você não é um homem, é um porco”, vaticinam as linhas escritas.

É por uma tomada na qual o protagonista vai de encontro a uma luz, ressurgindo posteriormente e sugerindo um movimento hiperbólico, que a sadia confusão temporal se estabelece e enriquece o novo filme de Severien.

Outro curta pernambucano no mesmo programa era “Muro”, de Tião, que parece ter tirado o fôlego da platéia mineira, exceto por um espectador que esbravejou com força ao final: “Coisa mais linda!!”.

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