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Críticas

Tudo acontece em Elizabethtown

O pop-existencialismo segundo Cameron Crown

Por Luiz Joaquim | 24.07.2018 (terça-feira)

-publicado em 2 de novembro de 2005 no jornal Folha de Pernambuco

Há um flerte mal-acabado com o acaso, e o ocaso, em Tudo acontece em Elizabethtown (Elizabethtown, EUA, 2005), nova comédia romântica de Cameron Crown (Quase Famosos e Vanilla Sky). O namoro aqui com o imprevisível parece querer dialogar com o de outros filmes do gênero, como Antes do Amanhecer (1996),  Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembrança (2004) e até mesmo Encontros e Desencontros (2004).

O problema em Elizabethtown é que o acaso não é usado apenas como mola propulsora para que Ben (Orlando Bloom, de Cruzada) – o protagonista estupefato com as malvadezas da vida – saia da inércia de uma depressão causada por um fiasco profissional com proporções de um bilhão de dólares. O acaso aqui ganha mais importância que a própria reação de Ben contra sua tristeza pelo fracasso. Está opção de Crown distrai, ou desvirtua o filme levando-o a uma viela que vai dar no humor pop (e eventualmente pobre) tão presente em sua obra.

Em outras palavras, Elizabethtown propõe uma, inicialmente bem-vinda, visão atônita sobre situações atônitas que o dinheiro e a presença da morte propiciam na vida normal de um jovem homem comum. Estas questões, que poderiam dar a nobre validação do filme, terminam por cair em facilidades situacionais e em personagens mal desenvolvidos, pensados originalmente para serem serenos e justos, como a pretensa menina legal Claire (Kirsten Dunst).

Ela interpreta a aeromoça falante que interpela e encanta Ben quando este voava à cidade natal para conduzir o funeral do pai. Sequências como o inocente e entusiasmado diálogo dos dois pelo telefone pode gerar identificação com o apaixonado espectador de todas as idades. Mas as impossibilidades que não permitem a definitiva união do casal soam inócuas, assim como a relação de Ben com a morte do pai e com seu próprio desejo suicida. Aquela séria descoberta sobre a fragilidade da vida, que cedo ou tarde acena para todos, tornar-se aqui um estandarte pop-existencialista.

Com um final arrastado e cansativo, Elizabethtown fica na cabeça como uma espécie de “filme-auto-ajuda” para os desvalidos; indicando-lhes um lugar no mundo onde o dinheiro não é tudo (mesmo se for US$ 1 bi) e o importante é “curtir” a vida. Para perceber isso num filme, sem que pareça piegas, talvez o melhor mesmo seja rever o francês A Vida Sonhada dos Anjos, no qual os fracassados são mesmos fracassados e sofrer também aparece como forma de trabalhar duro e ser desrespeitado como ser humano.

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